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Guia Completo

Oxigenoterapia: Guia Completo de Indicações, Manejo e Aplicações Clínicas

Por ResumeAi Concursos
Agrupamento de moléculas de O2 em fluxo, simbolizando a entrega de oxigênio na oxigenoterapia.

A oxigenoterapia é uma das pedras angulares no tratamento de diversas condições médicas, mas seu uso eficaz e seguro exige mais do que simplesmente "dar oxigênio". Como uma medicação potente, sua prescrição deve ser precisa, a administração criteriosa e o monitoramento constante. Este guia completo foi elaborado para capacitar você, profissional de saúde ou estudante da área, a navegar pelas complexidades da oxigenoterapia, desde suas indicações fundamentais e métodos de manejo até suas aplicações clínicas específicas em cenários como crises de asma e hipoxemia crônica. Nosso objetivo é fornecer um recurso claro, coeso e baseado em evidências para otimizar o cuidado ao paciente e evitar os riscos associados ao uso inadequado do oxigênio.

Entendendo a Oxigenoterapia: Fundamentos e Indicações Essenciais

A oxigenoterapia médica representa o uso terapêutico do oxigênio suplementar com o objetivo primordial de tratar ou prevenir os sintomas e as consequências da hipoxemia – uma condição caracterizada pela baixa concentração de oxigênio no sangue arterial. Essencialmente, o oxigênio é administrado para aumentar a quantidade de oxigênio disponível nos pulmões e, consequentemente, no sangue e nos tecidos, aliviando o trabalho respiratório e cardíaco. É crucial compreender que o oxigênio deve ser encarado como uma medicação, o que implica a necessidade de uma indicação precisa, dose (fluxo) correta, dispositivo de administração adequado, momento oportuno para iniciar e critérios claros para sua interrupção.

A principal indicação para iniciar a oxigenoterapia é a presença de hipoxemia, geralmente identificada por uma saturação periférica de oxigênio (SpO2) abaixo dos níveis considerados adequados. As recomendações gerais para iniciar a terapia são:

  • Hipoxemia confirmada: Pacientes com SpO2 inferior a 94% geralmente devem receber oxigenoterapia. O objetivo, na maioria dos casos, é manter a saturação entre 94% e 98%.
  • Cautela na indicação: Especialistas sugerem cautela ao iniciar o oxigênio suplementar. Não se recomenda iniciar a oxigenoterapia se a saturação de oxigênio estiver acima de 93% (recomendação forte). Para saturações entre 90-92%, o início da oxigenoterapia é considerado uma recomendação fraca, pois níveis oximétricos elevados em pacientes sob oxigenoterapia têm sido associados a um maior risco de mortalidade.
  • Situações Específicas: Em pacientes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) e risco de retenção de CO2, a meta de saturação é mais conservadora, geralmente entre 88% e 92%, para evitar a supressão do drive respiratório.

Além da hipoxemia, a oxigenoterapia é frequentemente utilizada para aliviar a dispneia (sensação de falta de ar), especialmente quando esta está associada à baixa oxigenação. No entanto, em contextos como cuidados paliativos, a oferta de oxigênio pode não ser suficiente para aliviar a dispneia se não houver hipoxemia subjacente.

Outras indicações clínicas importantes para a oxigenoterapia incluem:

  • Crises agudas de asma graves: Quando acompanhadas de hipoxemia (SpO2 < 94%).
  • Infarto Agudo do Miocárdio (IAM): Indicada se houver SpO2 < 94% (ou <90% em algumas diretrizes para SCA sem complicações), congestão pulmonar ou desconforto respiratório significativo.
  • Insuficiência respiratória aguda: Seja por pneumonia, síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) ou outras causas.
  • Intoxicação por monóxido de carbono: Neste caso, a oxigenoterapia hiperbárica (OHB) ou oxigênio a 100% normobárico são modalidades terapêuticas importantes.
  • Edema pulmonar de altitude e embolia gasosa: Também podem ser indicações para OHB.

É fundamental destacar a crescente preocupação com a hiperóxia (excesso de oxigênio), que pode ser deletéria. Por isso, a titulação cuidadosa do fluxo de oxigênio para atingir a saturação alvo, sem excedê-la desnecessariamente, é um pilar do manejo. A oxigenoterapia trata a consequência (baixa oxigenação), mas nem sempre a causa subjacente, e em certas condições, pode ser insuficiente ou até agravar o quadro, necessitando de suporte ventilatório.

Administração e Monitoramento da Oxigenoterapia: Dispositivos e Parâmetros Chave

A administração eficaz e o monitoramento cuidadoso da oxigenoterapia são cruciais. A escolha do dispositivo correto e a avaliação contínua da resposta do paciente são passos fundamentais.

Dispositivos para Administração de Oxigênio

Os dispositivos de oferta de oxigênio podem ser classificados em sistemas de baixo fluxo e alto fluxo:

  • Dispositivos de Baixo Fluxo:
    • Cateter Nasal (ou Cânula Nasal): Mais comum para baixas concentrações (FiO2 24-44%, fluxos 1-6 L/min). Recomenda-se 2-4 L/min na maioria. Em DPOC, evitar fluxos > 3 L/min para não suprimir o drive respiratório e manter SpO2 alvo. Não indicado em coma ou Glasgow ≤ 8.
  • Dispositivos de Alto Fluxo: Suprir a demanda inspiratória total, FiO2 mais precisas.
    • Máscara de Venturi: FiO2 precisa (24-60%) por adaptadores coloridos. Útil em DPOC com risco de retenção de CO2.
    • Máscara Não Reinalante com Reservatório: Altas concentrações (FiO2 60% a próximo de 100%, citada como até 95%). Para emergências (trauma grave, choque séptico, IRpA). Fluxo 10-15 L/min para manter reservatório inflado.
    • Cânula Nasal de Alto Fluxo (CNAF): Oxigênio aquecido e umidificado em fluxos elevados (até 60-70 L/min), FiO2 precisas (21-100%). Melhora conforto, reduz espaço morto, pode fornecer PEEP-like. Opção em crianças com Bronquiolite Viral Aguda (BVA).

Relação com o Suporte Ventilatório

Quando a oxigenoterapia otimizada não corrige a hipoxemia (SpO2 < 90% ou PaO2 < 60 mmHg persistente) ou há falência ventilatória, considera-se suporte ventilatório (ventilação não invasiva - VNI, ou intubação orotraqueal e ventilação mecânica invasiva).

Monitoramento da Eficácia da Oxigenoterapia

  • Saturação de Oxigênio (SpO2): Oximetria de pulso, não invasiva.
    • Metas Terapêuticas:
      • Geral: Manter SpO2 entre 94-98%. Em ventilação mecânica, 92-96%.
      • DPOC e Insuficiência Respiratória Crônica: Meta 88-92%.
      • Exacerbações de Asma: Manter SpO2 entre 93-95%.
      • COVID-19 (com necessidade de O2): Manter SpO2 entre 90-94%.
    • Interpretação: SpO2 < 90% geralmente corresponde a PaO2 < 60 mmHg. SpO2 < 93% em ar ambiente pode ser critério para internação.
  • Gasometria Arterial (PaO2 e PCO2): Medida direta de PaO2, PCO2, pH, bicarbonato.
    • PaO2: Padrão-ouro. Segundo o ATLS, oxigenação adequada é PaO2 > 70 mmHg.
    • Importância: Diagnóstico de insuficiência respiratória, distúrbios ácido-básicos, guia para FiO2 e suporte ventilatório.
  • Fração Inspirada de Oxigênio (FiO2): Concentração de O2 na mistura inalada.
    • Ajuste: Titular para a menor concentração que mantenha SpO2 alvo. Após intubação, inicia-se em 100% e ajusta-se rapidamente.
    • Toxicidade: FiO2 > 60% por > 24-48 horas pode causar toxicidade pulmonar (atelectasia de reabsorção, dano pulmonar).
    • Relação PaO2/FiO2 (P/F): Avalia gravidade da hipoxemia (SDRA). Relação SpO2/FiO2 (S/F) como alternativa.

Aplicações Clínicas da Oxigenoterapia

Com os fundamentos e métodos de administração e monitoramento estabelecidos, vejamos como a oxigenoterapia se aplica em cenários clínicos específicos.

Na Crise Aguda de Asma

A oxigenoterapia é crucial na crise de asma para corrigir a hipoxemia.

  • Indicações e Metas: Indicada para SpO2 < 94%. Objetivo é manter SpO2 entre 93-95% (ou 94-98% em algumas diretrizes). Em crises graves, usar máscara não reinalante.
  • Abordagem Inicial: Segue o ABC. Administrar O2, nebulização com beta-2 agonista de curta duração (SABA), e corticosteroides sistêmicos.
  • Avaliação da Gravidade: Sinais como taquipneia (>30 irpm), taquicardia (>110-140 bpm), uso de musculatura acessória, e "tórax silencioso" indicam gravidade.
  • Distúrbios Gasométricos: Inicialmente alcalose respiratória; com progressão, hipoxemia (PaO2 < 60 mmHg é grave) e, em casos severos, acidose respiratória (PaCO2 > 45 mmHg, sinal de falência iminente).
  • Gasometria Arterial: Indicada em dispneia persistente, PFE < 30% refratário, deterioração clínica, ou sinais de hipercapnia.
  • Asma Pediátrica: Hipoxemia é a principal causa de parada cardiorrespiratória. Agitação pode ser sinal de hipoxemia; sedação não recomendada nesses casos.
  • Heliox: Mistura hélio-oxigênio pode ser adjuvante em casos graves para reduzir trabalho respiratório.
  • Limitações da Oximetria: Não avalia gravidade da obstrução isoladamente (PFE é melhor) nem complicações como pneumotórax.

No Tratamento de Crises Hipoxêmicas Agudas e na Hipoxemia Crônica

A hipoxemia pode ser aguda ou crônica, exigindo abordagens distintas.

  • Manejando Crises Hipoxêmicas Agudas: Emergências que demandam otimização da oxigenação tecidual.

    • Administração de Oxigênio: Primeira medida, promove vasodilatação pulmonar.
    • Posicionamento: Posição inclinada para frente ou genupeitoral (crianças) para aumentar retorno venoso e otimizar mecânica ventilatória.
    • Suporte Medicamentoso: Sedativos (morfina), expansão volêmica, betabloqueadores ou vasoconstritores (ex: fenilefrina na Tetralogia de Fallot) conforme o caso.
    • A progressão não controlada pode levar a cianose, letargia, convulsões e parada cardiorrespiratória.
  • Hipoxemia Crônica: Deficiência persistente de oxigênio (SaO2 < 94% seriado).

    • Adaptações e Consequências: Policitemia, hipertensão pulmonar, cor pulmonale. Em pacientes com DPOC e retenção crônica de CO2, há risco de carbonarcose com oxigenoterapia excessiva (ver seção "Riscos").
    • Oxigenoterapia Domiciliar Prolongada (ODP): Aumenta sobrevida e qualidade de vida em insuficiência respiratória crônica com hipoxemia persistente (especialmente DPOC grave), quando o paciente está clinicamente estável e com tratamento otimizado.
      • Critérios para ODP:
        • PaO2 ≤ 55 mmHg ou SaO2 ≤ 88% em repouso, ar ambiente.
        • PaO2 entre 56-59 mmHg ou SaO2 = 89% com evidência de cor pulmonale, hipertensão pulmonar, policitemia (hematócrito > 55%), ou dessaturação noturna importante.
      • Uso mínimo de 15 horas por dia (ideal 24h). Prescrição após diagnóstico etiológico.

Em Outras Emergências e Contextos Específicos

  • Síndromes Coronarianas Agudas (SCA): Oxigenoterapia não rotineira. Indicada se SpO2 < 90-92% (algumas diretrizes citam <94% especialmente com complicações como IC), ou dispneia significativa. Cautela em pacientes com DPOC.
  • Bronquiolite Viral Aguda (BVA): Objetivo é manter SpO2 > 90-92%. Oxigênio aquecido e umidificado (preferencialmente por cânula nasal). Hidratação é crucial.
  • Pneumonia: Indicada para corrigir hipoxemia, visando SpO2 > 92-94%, como parte do tratamento de suporte.
  • Queimados: Todas as vítimas devem receber oxigênio suplementar em altas concentrações (idealmente 100%, umidificado) no atendimento inicial, especialmente com suspeita de lesão de vias aéreas por inalação ou intoxicação por monóxido de carbono (CO). Considerar intubação precoce se obstrução de via aérea.
  • Pneumoencéfalo: Administração de oxigênio a 100% por período prolongado (ex: mínimo 5 dias) pode acelerar a reabsorção do ar intracraniano.
  • Pacientes Terminais: Foco no conforto. Indicada para alívio da dispneia associada à hipoxemia. Não recomendada rotineiramente para dispneia com saturação normal.
  • Oxigenoterapia Combinada: Frequentemente, a oxigenoterapia é um componente de uma estratégia terapêutica combinada, garantindo oxigenação enquanto outras medicações tratam a causa base.

Oxigenoterapia: Práticas Seguras, Riscos e Controvérsias

Apesar de vital, a oxigenoterapia não é isenta de riscos e controvérsias, exigindo manejo criterioso.

  • Controvérsias Notáveis:
    • SCA em Normoxemia: O uso rotineiro de oxigênio em pacientes com SCA e SpO2 normal (ex: >90-92%) não é recomendado e pode ser prejudicial (vasoconstrição coronariana). Diretrizes variam nos pontos de corte exatos (algumas <90%, outras <94%). Consenso para uso se hipoxemia ou congestão pulmonar.
  • Potenciais Riscos Associados:
    • Hiperóxia e Toxicidade por Oxigênio: A exposição a altas FiO2 (>60%) por períodos prolongados (>24-48 horas) pode levar à toxicidade pulmonar, com inflamação, dano alveolar e atelectasias de reabsorção. FiO2 de 100% pode causar sinais de toxicidade em menos de 24 horas.
    • Carbonarcose em Pacientes com DPOC: Pacientes com DPOC avançada e retenção crônica de CO2 dependem do estímulo hipoxêmico para respirar. Oxigênio em fluxos elevados (resultando em SpO2 > 88-92%) pode suprimir este drive, levando à hipoventilação, acúmulo de CO2 (carbonarcose) e acidose respiratória grave.
  • Limitações da Terapia:
    • O oxigênio trata a hipoxemia, mas não necessariamente a doença de base.
    • Em pacientes com dispneia e SpO2 normal (>90-92%), a suplementação geralmente não alivia (exceto em casos específicos de DPOC ou cuidados paliativos).
    • Na crise vaso-oclusiva da doença falciforme, indicar O2 apenas se houver hipóxia comprovada.
  • Práticas Seguras e Manejo Criterioso:
    • Monitoramento Rigoroso: SpO2 contínua. Gasometria arterial para avaliação precisa e para guiar ajustes.
    • Titulação da FiO2: Sempre para a menor concentração capaz de atingir a saturação alvo (geralmente 92-96% para maioria dos pacientes agudos; 88-92% para DPOC com risco de hipercapnia).
    • Evitar a Hiperóxia Iatrogênica: O objetivo é corrigir a hipoxemia, não induzir hiperóxia desnecessária.
    • Avaliação Individualizada e Contínua: A necessidade de oxigênio é dinâmica e deve ser reavaliada frequentemente.

Dominar a oxigenoterapia é essencial para a prática médica. Trata-se de uma intervenção que, quando bem indicada e manejada, salva vidas e melhora a qualidade de vida. Contudo, seu uso indiscriminado ou inadequado pode trazer riscos significativos. Esperamos que este guia tenha solidificado seu entendimento sobre as nuances dessa terapia fundamental, reforçando a importância da precisão, do monitoramento e da individualização do cuidado.

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