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Análise Profunda

Radiculopatias: Guia Completo de Avaliação Neurológica e Diagnóstico Diferencial

Por ResumeAi Concursos
Corte transversal de vértebra com hérnia de disco comprimindo nervo espinhal inflamado, causa de radiculopatia.

Diante de um paciente com dor irradiada, formigamento ou fraqueza em um membro, o raciocínio clínico se torna um verdadeiro exercício de neuroanatomia aplicada. A capacidade de distinguir uma radiculopatia de suas mímicas e, mais importante, de localizar com precisão a raiz nervosa acometida antes mesmo de qualquer exame de imagem, é uma habilidade que define a excelência na prática médica. Este guia foi elaborado para ser seu aliado nesse desafio. Deixando de lado as generalidades, mergulhamos nos pilares da semiologia neurológica, oferecendo um roteiro prático e detalhado para a avaliação das radiculopatias cervicais e lombossacrais, culminando na navegação segura pelo diagnóstico diferencial. O objetivo é claro: transformar a suspeita clínica em um diagnóstico topográfico de alta confiança.

O Que é Radiculopatia e Como se Manifesta?

A radiculopatia é uma condição neurológica que ocorre quando uma ou mais raízes nervosas, no ponto em que saem da coluna vertebral, são comprimidas, irritadas ou danificadas. Pense nas raízes nervosas como os "cabos" que conectam a medula espinhal aos músculos e à pele. Quando um desses cabos sofre uma agressão, os sinais que ele transporta são interrompidos ou distorcidos, gerando um conjunto característico de sintomas.

As causas mais comuns para essa compressão são de natureza mecânica:

  • Hérnia de disco: É a causa mais frequente. O disco intervertebral, que funciona como um amortecedor entre as vértebras, pode se romper ou protruir, e seu conteúdo gelatinoso pode pressionar diretamente a raiz nervosa adjacente.
  • Osteófitos (Bicos de papagaio): O crescimento de projeções ósseas, comum em processos de osteoartrose da coluna, pode estreitar o forame neural (o espaço por onde a raiz nervosa passa), levando à sua compressão.

Independentemente da causa, a manifestação clínica da radiculopatia segue um padrão lógico, guiado pela anatomia. Os sintomas cardinais são:

  1. Dor Irradiada: Não é uma dor localizada apenas nas costas ou no pescoço. É uma dor aguda, em "choque" ou queimação, que segue o trajeto do nervo afetado. O exemplo clássico é a lombociatalgia, uma dor lombar que irradia pela perna, indicando um acometimento radicular lombossacral. Na radiculopatia cervical, a dor tipicamente se origina no pescoço e se irradia para o ombro, braço e mão.
  2. Alterações de Sensibilidade (Parestesias): O paciente pode relatar dormência, formigamento ou sensação de "agulhadas" em uma área específica da pele.
  3. Fraqueza Muscular: A compressão nervosa pode interromper os sinais motores, resultando em perda de força nos músculos inervados por aquela raiz específica.

A chave para o diagnóstico clínico está na distribuição desses sintomas. Cada raiz nervosa é responsável pela sensibilidade de uma faixa específica de pele, chamada dermátomo, e pela força de um grupo de músculos, o miótomo. Ao mapear a localização da dor, da parestesia e da fraqueza, o profissional pode suspeitar com alta precisão de qual raiz está sendo afetada.

Pilares da Avaliação Semiológica para Localizar a Lesão

Com a fisiopatologia em mente, a avaliação neurológica se torna uma busca sistemática por pistas que nos apontem com acurácia qual raiz nervosa está sofrendo. A investigação repousa sobre a análise correlacionada de três pilares semiológicos: força motora, sensibilidade e reflexos tendinosos profundos.

1. Avaliação da Força Motora (Miótomos)

A presença de fraqueza (paresia) em um músculo-chave sugere fortemente o envolvimento de sua raiz correspondente. A avaliação deve ser comparativa e graduada.

  • Músculos-chave cervicais:

    • C5: Abdução do ombro (deltoide) e flexão do cotovelo (bíceps).
    • C6: Extensão do punho.
    • C7: Extensão do cotovelo (tríceps) e flexão do punho.
    • C8: Flexão dos dedos.
    • T1: Abdução dos dedos (interósseos).
  • Músculos-chave lombossacrais:

    • L2/L3: Flexão do quadril (iliopsoas) e extensão do joelho (quadríceps).
    • L4: Dorsiflexão do tornozelo (tibial anterior).
    • L5: Extensão do hálux (extensor longo do hálux).
    • S1: Flexão plantar do tornozelo (gastrocnêmio-sóleo).

2. Avaliação da Sensibilidade (Dermátomos)

O trajeto da dor irradiada e as áreas de hipoestesia (sensibilidade diminuída) ou parestesia geralmente seguem o padrão dermatomal da raiz acometida, fornecendo pistas valiosas.

3. Avaliação dos Reflexos Tendinosos Profundos (RTPs)

Os reflexos oferecem uma janela objetiva para a integridade do arco reflexo. A hiporreflexia ou arreflexia (diminuição ou ausência de reflexo) é um sinal clássico de radiculopatia (lesão de neurônio motor inferior).

  • Reflexo Bicipital: Testa principalmente a raiz C5.
  • Reflexo Tricipital: Testa principalmente a raiz C7.
  • Reflexo Patelar: Testa as raízes L2 a L4, com predomínio de L4.
  • Reflexo Aquileu: Testa principalmente a raiz S1.

A verdadeira arte do diagnóstico reside em sintetizar as informações dos três pilares. O padrão congruente de achados é o que solidifica a hipótese. Por exemplo, um paciente com dor irradiada para a face posterior da perna, fraqueza na flexão plantar e reflexo Aquileu abolido tem uma sobreposição de achados (dermátomo, miótomo e reflexo) que aponta inequivocamente para uma radiculopatia de S1.

Guia Prático: Avaliação das Radiculopatias Lombo-Sacrais (L2-S4)

A avaliação neurológica é a pedra angular no diagnóstico da lombociatalgia. Um exame físico estruturado, organizado por raiz nervosa, permite localizar com precisão a lesão.

Avaliação por Nível Radicular

  • Raiz L4 (O "Nível do Joelho e Tornozelo"):

    • Função Motora: O movimento chave é a dorsiflexão do pé. Teste pedindo ao paciente que ande sobre os calcanhares. A dificuldade indica fraqueza do músculo tibial anterior.
    • Reflexo Chave: O reflexo patelar diminuído ou ausente é o marcador clássico.
    • Sensibilidade: Hipoestesia na face anterolateral da perna e maléolo medial.
  • Raiz L5 (O "Nível do Hálux"):

    • Função Motora: O teste mais específico é a extensão do hálux contra resistência.
    • Reflexo Chave: Crucialmente, a raiz L5 não possui um reflexo tendíneo profundo associado. A preservação dos reflexos patelar e aquileu, na presença de fraqueza na extensão do hálux, aponta fortemente para este nível.
    • Sensibilidade: Perda sensorial na face anterolateral da perna e no dorso do pé.
  • Raiz S1 (O "Nível do Tornozelo"):

    • Função Motora: A principal função é a flexão plantar do pé. Teste pedindo ao paciente que ande na ponta dos pés. A incapacidade de sustentar o peso indica fraqueza do gastrocnêmio.
    • Reflexo Chave: O reflexo aquileu abolido ou diminuído é o principal achado.
    • Sensibilidade: O dermátomo abrange a face posterior da perna e a região lateral e plantar do pé.
  • Raízes Sacrais Baixas (S2-S4):

    • Seu acometimento é uma emergência (síndrome da cauda equina). A avaliação deve incluir a sensibilidade perianal (em "sela") e, se indicado, a pesquisa do reflexo bulbocavernoso.

Manobras Especiais de Provocação

  • Teste de Lasègue (Elevação da Perna Estendida):
    • Técnica: Com o paciente em decúbito dorsal, o examinador eleva passivamente o membro inferior acometido, mantendo o joelho estendido.
    • Resultado Positivo: Reprodução da dor ciática característica do paciente (irradiando abaixo do joelho) entre 30 e 60 graus de elevação. É um forte indicador de compressão das raízes L5 ou S1.

Investigando a Dor no Membro Superior: Semiologia da Radiculopatia Cervical

A cervicobraquialgia — dor que se origina no pescoço e irradia para o membro superior — exige uma avaliação meticulosa para identificar a raiz nervosa comprometida.

Avaliação por Nível Radicular

  • Raiz C5:

    • Função Motora: Fraqueza na abdução do ombro (deltoide).
    • Reflexo Chave: Reflexo bicipital diminuído ou ausente.
    • Sensibilidade: Dor e parestesia na face lateral do ombro e do braço.
  • Raiz C6:

    • Função Motora: Fraqueza na extensão do punho.
    • Reflexo Chave: O reflexo bicipital também pode estar diminuído.
    • Sensibilidade: Dor irradiada pela face lateral do antebraço até o polegar e o dedo indicador.
  • Raiz C7:

    • Função Motora: Fraqueza na extensão do cotovelo (tríceps).
    • Reflexo Chave: Reflexo tricipital diminuído ou ausente.
    • Sensibilidade: Sintomas na face posterior do braço e antebraço, estendendo-se até o dedo médio.

Manobras Especiais de Provocação

  • Teste de Spurling:
    • Técnica: Com o paciente sentado, o examinador realiza uma extensão e rotação lateral da cabeça para o lado sintomático, aplicando uma leve pressão axial no topo da cabeça.
    • Resultado Positivo: Reprodução da dor radicular no membro superior, indicando compressão foraminal da raiz nervosa.

Dominando o Diagnóstico Diferencial: Radiculopatia vs. Outras Condições

A dor irradiada é o cartão de visita da radiculopatia, mas não é exclusiva. A diferenciação precisa é fundamental para o manejo correto.

Radiculopatia vs. Mononeuropatia Periférica

A chave para a diferenciação está no mapa da inervação.

  • Radiculopatia: Os sintomas seguem um padrão de dermátomo e miótomo específico da raiz acometida na coluna.
  • Mononeuropatia Periférica: A lesão ocorre em um nervo periférico já formado, distalmente à raiz. Os sintomas se restringem ao território daquele nervo específico (ex: Síndrome do Túnel do Carpo, com sintomas no território do nervo mediano).

Ampliando o Horizonte: Plexopatias e Lesões Medulares

  • Plexopatia: Lesão no plexo nervoso (braquial ou lombossacral). O quadro é complexo, com déficits que abrangem múltiplos dermátomos e miótomos, mas que não correspondem a uma lesão medular completa.
  • Lesão Medular: O problema está na própria medula espinhal. A diferenciação depende da pesquisa de sinais de lesão do neurônio motor superior. O achado mais emblemático é o Sinal de Babinski positivo (extensão do hálux ao estímulo plantar), que aponta para uma causa medular ou cerebral, afastando o diagnóstico de uma radiculopatia isolada (lesão de neurônio motor inferior).

A Emergência Neurológica: Síndrome da Cauda Equina

É uma radiculopatia massiva e bilateral, uma emergência cirúrgica causada pela compressão de múltiplas raízes lombossacrais. Os sinais de alarme são:

  • Anestesia em sela (perda de sensibilidade na região perineal, nádegas internas e genitais).
  • Disfunção vesical e/ou intestinal de início agudo (retenção ou incontinência).
  • Fraqueza progressiva e bilateral nos membros inferiores.

A presença de anestesia em sela é o sintoma mais característico e exige ação imediata.

Dominar a avaliação da radiculopatia é, em essência, dominar a arte de traduzir os sintomas do paciente em um mapa neuroanatômico preciso. A abordagem sistemática, correlacionando os achados motores, sensitivos e de reflexos, não apenas confirma a suspeita, mas localiza a lesão com uma precisão que orienta toda a conduta subsequente. Essa habilidade clínica é a base para um diagnóstico diferencial robusto e para a tomada de decisão terapêutica racional e eficaz.

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