A rotura prematura de membranas, popularmente conhecida como "bolsa rota antes da hora", é uma das intercorrências obstétricas que mais geram dúvidas e apreensão, tanto em gestantes quanto em profissionais de saúde. Compreender seus mecanismos, riscos e as nuances do manejo é crucial para garantir os melhores desfechos para mãe e bebê. Este guia completo foi meticulosamente preparado por nossa equipe editorial para desmistificar a RPM, oferecendo um panorama claro e baseado em evidências sobre seu diagnóstico, as condutas atuais para diferentes idades gestacionais, os riscos associados e as possíveis estratégias de prevenção, capacitando você com conhecimento essencial para a prática clínica e para a tomada de decisões informadas.
O Que é Rotura Prematura de Membranas (RPM) e Quais Seus Fatores de Risco?
Durante a gestação, o bebê desenvolve-se imerso no líquido amniótico, protegido por uma bolsa formada por duas membranas delgadas, porém resistentes: o âmnio (mais interna) e o córion (mais externa). Essa bolsa e o líquido que ela contém são vitais para o desenvolvimento fetal, oferecendo proteção contra traumas, infecções, mantendo a temperatura estável e permitindo o crescimento e movimentação do feto.
A Rotura Prematura de Membranas (RPM) é definida, de forma precisa, como a ruptura espontânea das membranas amniótica e coriônica antes do início do trabalho de parto, independentemente da idade gestacional. Este é um ponto crucial: a RPM pode ocorrer tanto em gestações a termo quanto prematuras.
É importante distinguir a RPM de outras situações:
- Rotura Precoce de Membranas: Ocorre no início do trabalho de parto, geralmente com o colo uterino começando a dilatar.
- Rotura Prolongada de Membranas: Refere-se a um intervalo de 18 horas ou mais entre a ruptura das membranas e o nascimento do bebê, aumentando o risco de infecções.
- Ruptura antes de 20 semanas de gestação: Geralmente é classificada como abortamento e não como RPM, devido às implicações e manejo distintos.
Classificando a RPM: Uma Questão de Tempo Gestacional
A idade gestacional no momento da ruptura é o principal fator para classificar a RPM e guiar a conduta médica:
- Rotura Prematura de Membranas Pré-termo (RPMPT): Ocorre antes de 37 semanas completas de gestação. Esta forma é particularmente preocupante devido aos riscos associados à prematuridade do bebê.
- Rotura Prematura de Membranas de Termo (RPMT): Ocorre a partir de 37 semanas completas de gestação, quando o feto já é considerado maduro.
Por Que Acontece? Etiologia e Fatores de Risco da RPM
A RPM é uma condição multifatorial, ou seja, diversas causas e fatores podem contribuir para o enfraquecimento e ruptura das membranas. Embora nem sempre seja possível identificar uma causa única, alguns fatores de risco são bem estabelecidos:
- Histórico de RPM pré-termo em gestação anterior: Este é considerado o fator de risco mais significativo para a recorrência.
- Infecções:
- Infecções do trato genital inferior: Vaginose bacteriana, tricomoníase, infecções por clamídia ou gonorreia podem ascender e enfraquecer as membranas.
- Infecção urinária.
- Corioamnionite: Infecção das membranas amnióticas e do líquido amniótico. Pode ser tanto uma causa quanto uma consequência da RPM, representando um risco sério para mãe e feto.
- Diminuição da atividade bactericida do líquido amniótico.
- Fatores Mecânicos e Estruturais:
- Sobredistensão uterina: Causada por polidrâmnio (excesso de líquido amniótico) ou gestação múltipla (gêmeos, trigêmeos).
- Colo uterino curto ou incompetência istmo-cervical: Um colo enfraquecido pode não suportar a pressão da bolsa.
- Trauma abdominal.
- Procedimentos invasivos como amniocentese (raro).
- Condições Maternas e Hábitos de Vida:
- Tabagismo: Prejudica a oxigenação dos tecidos e a integridade das membranas.
- Uso de drogas ilícitas.
- Baixo nível socioeconômico e desnutrição materna (baixo IMC).
- Sangramento vaginal durante o segundo ou terceiro trimestre.
- Doenças do colágeno: Como a Síndrome de Ehlers-Danlos, que afeta a integridade dos tecidos conjuntivos, incluindo as membranas fetais.
- Outros: Estresse, fatores intrínsecos da membrana.
É importante notar que a cerclagem uterina (procedimento para reforçar o colo do útero) é contraindicada se a RPM já ocorreu, devido ao risco aumentado de infecção.
A Importância da Idade Gestacional e do Período de Latência na RPM
- Idade Gestacional (IG): A IG no momento da RPM é o pilar para definir a conduta médica e o prognóstico. Uma datação precisa da gestação, idealmente confirmada por ultrassonografia no primeiro trimestre, é crucial.
- Período de Latência: Refere-se ao intervalo de tempo entre a ruptura das membranas e o início efetivo do trabalho de parto.
- Este período é inversamente proporcional à idade gestacional:
- Em RPM de termo, a maioria das gestantes (cerca de 90%) entra em trabalho de parto espontaneamente em até 24 horas.
- Em RPM pré-termo, o período de latência pode ser mais longo, variando de dias a semanas, especialmente em idades gestacionais mais precoces.
- Um período de latência prolongado, principalmente em gestações pré-termo, aumenta o risco de complicações, sendo a infecção intrauterina (corioamnionite) a mais temida.
- Este período é inversamente proporcional à idade gestacional:
RPM e Oligoâmnio: Uma Relação Direta e Significativa
A RPM é a principal causa de oligoâmnio, que é a redução do volume de líquido amniótico. A perda contínua de líquido pela vagina após a ruptura da bolsa leva a essa diminuição. O oligoâmnio, por sua vez, pode trazer complicações adicionais, especialmente se for severo e ocorrer precocemente na gestação (antes de 24 semanas) e persistir:
- Hipoplasia pulmonar: Desenvolvimento inadequado dos pulmões fetais, uma complicação grave.
- Deformidades esqueléticas fetais: Devido à compressão.
- Compressão do cordão umbilical: Podendo levar à diminuição do fluxo sanguíneo e oxigênio para o feto.
Compreender o que é a RPM, seus tipos e, fundamentalmente, seus fatores de risco é o primeiro passo para um acompanhamento pré-natal atento e para a adoção de medidas preventivas quando possível, visando sempre a saúde da mãe e do bebê.
Diagnóstico da RPM: Confirmando a "Bolsa Rota" e Exames Essenciais
A suspeita de Rotura Prematura de Membranas (RPM) exige uma avaliação cuidadosa e precisa. Confirmar o diagnóstico é crucial, pois a conduta médica dependerá diretamente dessa confirmação, da idade gestacional e das condições materno-fetais.
A Avaliação Clínica: O Padrão-Ouro
O diagnóstico da RPM é, em sua essência, clínico. A base para a confirmação reside na combinação da história da paciente e do exame físico:
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Anamnese Detalhada: O ponto de partida é a queixa da gestante. Tipicamente, ela relata uma perda súbita de líquido pela vagina, que pode ser em grande quantidade ou um fluxo contínuo e mais discreto, sem a presença de contrações uterinas características do trabalho de parto. É importante questionar sobre a cor, o odor e a quantidade do líquido perdido.
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Exame Especular Estéril: Este é considerado o padrão-ouro para o diagnóstico da RPM. Durante o exame ginecológico com espéculo (instrumento que permite visualizar o colo do útero), o médico busca observar diretamente a saída de líquido amniótico através do orifício externo do colo uterino. A simples visualização desse extravasamento confirma o diagnóstico em cerca de 90% dos casos.
- Manobras Auxiliares: Para facilitar a visualização, especialmente se a perda de líquido não for abundante no momento do exame, podem ser realizadas algumas manobras:
- Manobra de Valsalva: Pede-se à paciente para tossir ou fazer força como se fosse evacuar. Isso aumenta a pressão intra-abdominal e pode provocar a saída de líquido amniótico.
- Manobra de Tarnier: Consiste na mobilização suave da apresentação fetal (a parte do bebê que está mais baixa na pelve) e/ou uma leve compressão do fundo uterino. Isso também pode ajudar a exteriorizar o líquido.
- Manobras Auxiliares: Para facilitar a visualização, especialmente se a perda de líquido não for abundante no momento do exame, podem ser realizadas algumas manobras:
A Importância de Evitar Toques Vaginais Desnecessários
Um ponto fundamental no manejo da suspeita de RPM, especialmente fora do trabalho de parto ativo, é evitar ou minimizar ao máximo os toques vaginais. Cada toque vaginal aumenta significativamente o risco de introduzir bactérias na cavidade uterina, o que pode levar a uma infecção grave chamada corioamnionite. Portanto, o toque vaginal só deve ser realizado se a gestante estiver em trabalho de parto franco ou se for estritamente necessário para uma decisão terapêutica imediata.
Testes Complementares: Quando a Clínica Deixa Dúvidas
Em situações onde a história é sugestiva, mas o exame especular não é conclusivo (não se visualiza a saída ativa de líquido), alguns testes complementares podem ser empregados para auxiliar no diagnóstico:
- Teste do pH Vaginal: O líquido amniótico é alcalino (pH entre 7,0 e 7,5), enquanto a secreção vaginal normal é ácida (pH entre 3,8 e 4,5). Uma fita de papel de nitrazina ou outro indicador de pH é colocada em contato com o líquido coletado do fundo de saco vaginal. Se o pH for igual ou superior a 6,0-6,5, sugere a presença de líquido amniótico.
- Limitações: Resultados falso-positivos podem ocorrer na presença de sangue, sêmen, vaginose bacteriana, tricomoníase ou uso de antissépticos alcalinos.
- Teste de Cristalização (Fern Test): Uma amostra do líquido vaginal é colocada em uma lâmina de vidro, deixada secar ao ar e depois observada ao microscópio. O líquido amniótico, devido à presença de eletrólitos e proteínas, cristaliza formando um padrão característico semelhante a "folhas de samambaia".
- Limitações: A presença de muco cervical ou impressões digitais na lâmina pode interferir no resultado.
- Detecção da Proteína Microglobulina Alfa-1 Placentária (PAMG-1): Este é um teste mais específico e sensível. A PAMG-1 é uma proteína encontrada em altas concentrações no líquido amniótico e em baixíssimas concentrações nas secreções cervicovaginais normais. Testes comerciais rápidos podem detectar a PAMG-1 no fluido vaginal, oferecendo alta acurácia diagnóstica.
- Outros Testes: Testes como a pesquisa de células orangiófilas (células fetais coradas com Azul de Nilo) ou a dosagem de outros marcadores bioquímicos são menos utilizados na prática rotineira devido à disponibilidade, custo ou menor acurácia em comparação com os métodos citados.
É importante notar que, se o exame especular for claramente positivo, os testes complementares geralmente não são necessários.
O Papel (e Limitações) da Ultrassonografia
A ultrassonografia (USG) pode ser útil para avaliar o volume de líquido amniótico, geralmente medido pelo Índice de Líquido Amniótico (ILA). A presença de oligoâmnio (volume de líquido amniótico reduzido) pode corroborar a suspeita de RPM, mas a USG isoladamente não confirma nem exclui o diagnóstico de RPM.
- Limitações:
- Uma gestante pode ter RPM com volume de líquido amniótico normal ou próximo do normal, especialmente se a rotura for recente ou pequena.
- Oligoâmnio pode ter outras causas, como insuficiência placentária, malformações renais fetais ou restrição de crescimento fetal. A USG é mais valiosa para avaliar o bem-estar fetal, estimar a idade gestacional, determinar a apresentação fetal e auxiliar no planejamento da conduta, mas não como ferramenta primária para diagnosticar a rotura das membranas.
Diagnóstico Diferencial
É crucial diferenciar a RPM de outras condições que podem causar perda de líquido pela vagina, como:
- Incontinência urinária de esforço (comum na gestação)
- Leucorreia fisiológica abundante (aumento da secreção vaginal normal)
- Eliminação do tampão mucoso (geralmente mais espesso e pode conter raias de sangue)
- Presença de sêmen após relação sexual
- Vaginoses ou vaginites com corrimento aumentado
A história clínica detalhada e as características do líquido observado geralmente ajudam nessa diferenciação. Uma vez confirmado o diagnóstico, a conduta será guiada pela idade gestacional e pelas condições materno-fetais.
Conduta na RPM a Termo (≥ 37 Semanas): Indução Imediata ou Conduta Expectante?
Quando a bolsa amniótica se rompe em uma gestação que já atingiu o termo (37 semanas completas ou mais), a decisão entre induzir o parto imediatamente ou aguardar o início espontâneo do trabalho de parto é central.
A Balança Pende para a Indução Imediata (Conduta Ativa)
Na grande maioria dos casos de RPM a termo, a conduta ativa, com indução imediata do trabalho de parto, é a mais recomendada. O principal racional é a redução significativa do risco de infecções, como a corioamnionite materna e a sepse neonatal. Com a bolsa rota, a barreira natural contra microrganismos é perdida.
- Vantagens da Indução Imediata:
- Menor incidência de corioamnionite e febre materna.
- Menor risco de infecção neonatal precoce.
- Potencial redução do tempo de internação.
- Planejamento mais controlado do parto.
A indução geralmente envolve ocitocina intravenosa, podendo ser precedida por prostaglandinas (como misoprostol vaginal) se o colo uterino estiver imaturo (escore de Bishop desfavorável).
E a Conduta Expectante? É uma Opção Viável?
A conduta expectante na RPM a termo envolve aguardar o início espontâneo do trabalho de parto por 12 a 24 horas, sob rigorosa vigilância hospitalar. Cerca de 90% das gestantes com RPM a termo entram em trabalho de parto espontaneamente em 24 horas.
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Quando a Conduta Expectante Pode Ser Considerada:
- Preferência da gestante informada sobre riscos e benefícios.
- Ausência de sinais de infecção materna ou comprometimento fetal.
- Garantia de monitoramento materno-fetal contínuo em ambiente hospitalar.
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Desvantagens e Riscos da Conduta Expectante:
- Aumento da incidência de corioamnionite e infecção neonatal com o prolongamento do tempo de bolsa rota.
- Pode gerar ansiedade.
A decisão pela conduta expectante deve ser compartilhada, com reversão para indução ao menor sinal de complicação.
Situações que Exigem Resolução da Gestação
Independentemente da idade gestacional a termo, a resolução da gestação é indicada de forma mais urgente em casos de:
- Sinais clínicos de corioamnionite.
- Sofrimento fetal agudo.
- Sangramento vaginal ativo e importante (suspeita de descolamento prematuro de placenta - DPP).
- Lesões ativas de herpes genital (neste caso, a via de parto indicada é a cesárea).
- Trabalho de parto franco.
- Óbito fetal.
RPM a Termo: Cesárea Não é a Primeira Escolha!
É crucial reforçar que a RPM a termo, por si só, NÃO é uma indicação para cesariana. A via de parto preferencial é a vaginal. A cesárea reserva-se para indicações obstétricas clássicas (falha de indução, sofrimento fetal não responsivo, apresentação anômala, etc.).
A Importância da Profilaxia para Estreptococo do Grupo B (EGB)
A profilaxia antibiótica intraparto para o Estreptococo do Grupo B (EGB) (geralmente com penicilina ou ampicilina IV) é fundamental e deve ser administrada a todas as gestantes com RPM a termo que tenham cultura positiva para EGB, filho anterior com doença por EGB, bacteriúria por EGB na gestação atual, ou status para EGB desconhecido.
Manejo da RPM Pré-termo (< 37 Semanas): Estratégias Centrais e Hospitalização
A rotura prematura de membranas antes das 37 semanas (RPM pré-termo - RPMPT) exige uma abordagem focada em prolongar a gestação de forma segura, visando reduzir os riscos da prematuridade para o feto.
A conduta expectante hospitalar é a estratégia central, especialmente em idades gestacionais mais precoces. A internação hospitalar é mandatória e imediata após o diagnóstico para monitoramento contínuo materno-fetal e intervenção rápida se necessário.
Cuidados Essenciais e Monitoramento na Conduta Expectante Hospitalar:
- Avaliação Inicial e Contínua: Confirmação da idade gestacional, monitoramento de sinais de corioamnionite (febre, taquicardia materna/fetal, sensibilidade uterina), e avaliação da vitalidade fetal (cardiotocografia, perfil biofísico fetal, dopplerfluxometria).
- Monitoramento Materno Detalhado: Controle regular de temperatura, frequência cardíaca, e exames laboratoriais (hemograma, PCR) para detecção de infecção.
- Rastreamento e Intervenções Farmacológicas (detalhadas na próxima seção):
- Coleta de cultura para EGB.
- Antibioticoterapia para prolongar latência e reduzir infecção.
- Corticosteroides para maturação pulmonar fetal (entre 24 e 34 semanas, podendo ser considerado até 36s6d).
- Sulfato de magnésio para neuroproteção fetal (risco de parto iminente < 32-33s6d).
- Medidas Gerais de Suporte: Repouso relativo e hidratação oral. A hiper-hidratação venosa não demonstrou benefícios consistentes.
Estratégias Conforme a Idade Gestacional:
- Entre 24 e 33 6/7 semanas: A conduta é predominantemente expectante, implementando todas as estratégias farmacológicas e de monitoramento para maximizar o tempo intraútero. A indução do parto ocorre apenas se surgirem complicações (infecção, sofrimento fetal).
- Entre 34 e 36 6/7 semanas: O manejo evoluiu. Embora a indução fosse comum, diretrizes recentes sugerem que a conduta expectante pode ser uma opção viável para alcançar 37 semanas, se não houver sinais de infecção ou comprometimento fetal. A decisão deve ser individualizada e discutida com a paciente. Profilaxia para EGB é administrada conforme indicação.
A conduta expectante é interrompida e a resolução da gestação se torna imperativa na presença de corioamnionite clínica, sofrimento fetal, ou trabalho de parto ativo que não possa ser inibido (a tocólise é geralmente contraindicada, salvo raras exceções).
Intervenções Farmacológicas na RPM Pré-termo: Antibióticos, Corticoides e Tocólise
No manejo da RPM pré-termo, a farmacologia é uma aliada crucial, com foco em antibióticos, corticosteroides e uma avaliação criteriosa sobre tocolíticos.
Antibioticoterapia: Uma Linha de Defesa Essencial
A antibioticoterapia na conduta expectante hospitalar da RPM pré-termo (geralmente entre 24 e 33s6d) visa:
- Prolongar o período de latência.
- Reduzir o risco de infecções (corioamnionite materna e infecções neonatais).
Um regime comum envolve Ampicilina IV seguida de Amoxicilina oral, associada a um macrolídeo (Azitromicina ou Eritromicina), por 7 dias. Esta antibioticoterapia difere daquela usada para tratar corioamnionite instalada. A profilaxia intraparto para Estreptococo do Grupo B (EGB) (Penicilina G ou Ampicilina) é indicada se a cultura for positiva, desconhecida, ou se o curso para latência já terminou e a paciente entra em trabalho de parto.
Corticosteroides: Preparando o Bebê para o Mundo
A administração de corticosteroides antenatais (Betametasona ou Dexametasona), idealmente entre 24 e 34 semanas (podendo se estender até 36s6d em protocolos específicos), é padrão. O principal benefício é a aceleração da maturação pulmonar fetal, reduzindo a incidência e gravidade da Síndrome do Desconforto Respiratório (SDR) e outras complicações da prematuridade. Geralmente, um único curso é administrado.
Tocólise: Uma Ferramenta de Uso Restrito e Criterioso
A tocólise (inibição das contrações uterinas) tem papel muito limitado e é geralmente contraindicada na RPM pré-termo, pois pode mascarar infecção. Exceções para um curso curto (48 horas) podem incluir:
- Permitir que o ciclo completo de corticosteroides seja administrado.
- Permitir a transferência para um centro com UTIN.
A tocólise não é indicada rotineiramente, especialmente com sinais de infecção, sofrimento fetal, idade gestacional >34 semanas, ou trabalho de parto avançado. Selantes de tecidos não são recomendados.
Complicações da RPM: Impactos Maternos e Fetais e Alerta para Corioamnionite
A RPM, especialmente quando prolongada ou em gestações pré-termo, pode levar a diversas complicações.
Impactos Maternos:
A principal complicação é a infecção intrauterina:
- Corioamnionite: Infecção das membranas e do líquido amniótico, ocorrendo em 15-25% dos casos de RPM, com risco aumentado pela duração da rotura.
- Endometrite: Infecção do endométrio no pós-parto.
Outros riscos incluem:
- Descolamento Prematuro de Placenta (DPP).
- Prolapso de cordão umbilical.
- Retenção placentária.
Impactos Fetais e Neonatais:
- Prematuridade: Principal consequência da RPMPT, com riscos de imaturidade pulmonar, neurológica, etc.
- Sepse Neonatal: Transmissão da infecção intrauterina ao feto.
- Hipoplasia Pulmonar: Em RPM muito precoce (<20-24 semanas) com oligoâmnio severo e prolongado. Pode estar associada à Sequência de Potter.
- Complicações do Oligoâmnio:
- Compressão do cordão umbilical (sofrimento fetal).
- Deformidades fetais (contraturas, fácies de Potter).
- Raramente, síndrome da banda amniótica.
- Aspiração de mecônio.
Alerta Especial: Corioamnionite – Diagnóstico e Manejo
A corioamnionite exige atenção redobrada.
- Diagnóstico:
- Sinais Clínicos: Febre materna (>38°C), taquicardia materna (>100 bpm) ou fetal (>160 bpm), útero doloroso/irritável, secreção vaginal fétida/purulenta.
- Achados Laboratoriais: Leucocitose materna (>15.000-20.000/mm³ com desvio à esquerda), PCR elevada. O hemograma alterado sugere infecção, mas não diagnostica RPM.
- Manejo: Exige conduta ativa e imediata, independentemente da idade gestacional:
- Antibioticoterapia de Amplo Espectro: Iniciar o mais rápido possível (cobrindo Gardnerella vaginalis, E. coli, EGB, Bacteroides spp., enterococos).
- Resolução da Gestação: Interrupção da gravidez para remover o foco infeccioso. Via de parto preferencial é a vaginal (indução se não houver contraindicações). Cesárea para indicações obstétricas habituais.
- Contraindicações: Na corioamnionite, tocólise e corticoterapia para maturação pulmonar são contraindicadas.
Diferenciando de Outras Emergências: O Caso da Rotura Uterina
A RPM não tem relação causal direta com a rotura uterina, uma emergência distinta (disjunção da parede uterina, geralmente associada a cicatrizes prévias), com sinais como dor abdominal súbita e intensa, parada de contrações, sangramento, choque materno e alterações fetais. O manejo da rotura uterina é cirúrgico (cesárea de emergência).
RPM e o Parto: Conduzindo o Nascimento e Estratégias de Prevenção
Confirmada a RPM, a condução do parto é guiada pela idade gestacional e estado clínico materno-fetal, buscando equilibrar os riscos da prematuridade com os de infecção.
Conduzindo o Trabalho de Parto na RPM
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Em gestações pré-termo (< 37 semanas):
- Entre 34 e 36 semanas e 6 dias: Frequentemente, opta-se pela indução do parto para reduzir o risco infeccioso, especialmente com maturidade pulmonar fetal ou seguindo protocolos. Corticoides podem ser considerados se não administrados previamente e houver tempo hábil.
- Abaixo de 34 semanas (RPMPT): A conduta expectante hospitalar, como detalhado anteriormente, é preferida na ausência de complicações, visando o amadurecimento fetal com suporte de corticoterapia, antibioticoterapia profilática e, quando indicado (<32 semanas), sulfato de magnésio para neuroproteção. A tocólise pode ser considerada brevemente para otimizar o efeito dos corticoides.
- Indicação de Interrupção da Gestação (Parto): A presença de corioamnionite clínica, sofrimento fetal, descolamento prematuro de placenta significativo ou trabalho de parto ativo que não possa ser inibido, indicam a resolução da gestação, independentemente da idade gestacional.
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Em gestações a termo (≥ 37 semanas):
- Se não houver trabalho de parto espontâneo em algumas horas, a indução do trabalho de parto com ocitocina ou prostaglandinas é a conduta mais comum para minimizar o risco infeccioso.
Via de Parto e Intervenções
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Parto Vaginal vs. Cesárea:
- Na ausência de contraindicações obstétricas, o parto vaginal é a via preferencial, mesmo em muitos casos de prematuridade com apresentação cefálica.
- A cesárea é reservada para indicações obstétricas clássicas (ex: apresentação fetal anômala em prematuros, placenta prévia, sofrimento fetal agudo, histórico de múltiplas cesáreas anteriores). Condições como vasa prévia com rotura de membranas e sangramento fetal ativo exigem cesárea de emergência.
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Amniorrexe Oportuna: Uma Intervenção Distinta da RPM
- A RPM é a rotura espontânea antes do trabalho de parto. A amniorrexe oportuna (amniotomia) é a ruptura artificial das membranas durante a fase ativa do trabalho de parto para otimizar sua progressão.
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Uso de Fórcipe e Rotura de Membranas
- A bolsa rota é um critério essencial para a aplicabilidade do fórcipe obstétrico.
Estratégias de Prevenção da RPM
Embora nem todos os casos sejam preveníveis, algumas estratégias focam no controle de fatores de risco:
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Rastreamento e Tratamento de Infecções:
- O tratamento de infecções do trato genital inferior sintomáticas (vaginose bacteriana, tricomoníase) e de infecção do trato urinário (ITU) durante o pré-natal é crucial.
- A RPM é uma das principais causas de parto prematuro (20-30% dos casos).
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Manejo de Condições Associadas:
- Cerclagem Uterina: Se a RPM ocorre em paciente com cerclagem, esta deve ser removida para reduzir risco de infecção.
- Inserção Velamentosa do Cordão: Aumenta o risco de RPM e de rotura de vasos umbilicais na amniorrexe.
Entender a Rotura Prematura de Membranas é fundamental para um cuidado obstétrico de excelência e para que gestantes possam participar ativamente das decisões sobre sua saúde e a de seu bebê. Desde o diagnóstico ágil até as complexas decisões de manejo no pré-termo e a termo, o conhecimento detalhado sobre RPM, suas complicações e estratégias de prevenção capacita profissionais e pacientes. Esperamos que este guia tenha sido uma fonte valiosa de informação.
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