A chegada de um bebê é o clímax de uma jornada inesquecível, mas o que acontece nos minutos e na primeira hora após o nascimento é igualmente decisivo, especialmente para a segurança da mãe. Muitas vezes, o foco da atenção se volta inteiramente para o recém-nascido, mas o corpo materno ainda está concluindo um processo complexo e delicado. Este guia foi criado para iluminar exatamente essas etapas finais: a expulsão da placenta (dequitação), os riscos de um parto rápido demais e a crucial primeira hora pós-parto. Entender esses momentos não é apenas para satisfazer a curiosidade; é uma ferramenta poderosa para uma experiência de parto mais segura, consciente e tranquila.
O Que é a Dequitação? Entendendo o Terceiro Período do Parto
A emoção da chegada do bebê é imensa, mas o processo do parto ainda reserva uma etapa final, crucial para a segurança da mãe: o terceiro período do trabalho de parto. Este estágio, que se inicia imediatamente após o nascimento e termina com a expulsão completa da placenta e das membranas fetais, é tecnicamente conhecido como dequitação. Você também poderá ouvi-lo ser chamado por outros nomes, como secundamento ou delivramento.
A fisiologia por trás da dequitação é um exemplo notável da sabedoria do corpo. Após a saída do bebê, o útero, que estava imensamente distendido, começa a contrair-se vigorosamente. A placenta, no entanto, não possui a mesma elasticidade e não encolhe. Essa diferença de tamanho faz com que ela se descole da parede uterina, e essas mesmas contrações são responsáveis por empurrá-la para fora do corpo.
Uma dúvida comum é sobre quanto tempo essa fase dura. O processo é geralmente rápido:
- Na grande maioria dos partos, a dequitação ocorre de forma espontânea nos primeiros 5 a 10 minutos.
- A equipe médica considera normal que este processo leve até 30 minutos.
Um tempo superior a isso caracteriza uma dequitação prolongada, uma condição que exige atenção por aumentar o risco de complicações, como a hemorragia pós-parto. O local onde a placenta estava inserida no útero é uma área ampla e rica em vasos sanguíneos. Após o descolamento, as fortes contrações uterinas deste período atuam como um "torniquete natural", comprimindo esses vasos e estancando o sangramento de forma eficaz.
Manejo da Dequitação e Suas Complicações
Existem duas abordagens principais para conduzir a dequitação, sendo o manejo ativo o mais recomendado atualmente por reduzir significativamente o risco de sangramento excessivo.
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Manejo Ativo: Envolve um conjunto de intervenções coordenadas:
- Administração de Ocitocina: Logo após o nascimento, administra-se uma dose de ocitocina para estimular contrações uterinas fortes.
- Tração Controlada do Cordão Umbilical: O profissional aplica uma tração suave e contínua no cordão enquanto faz uma contrapressão no útero, guiando a placenta para fora.
- Clampeamento Oportuno do Cordão: Recomenda-se aguardar de 1 a 3 minutos antes de clampear o cordão, permitindo um fluxo sanguíneo adicional para o bebê.
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Manejo Expectante (ou Fisiológico): A equipe aguarda a expulsão espontânea da placenta. Pode ser considerado em gestantes de baixo risco, mas o manejo ativo é geralmente preferido por seus benefícios comprovados.
Complicações e Avaliação Final
Quando a placenta não é expulsa em até 30 minutos, temos um quadro de dequitação prolongada, que aumenta o risco de hemorragia. A conduta médica é a extração manual da placenta, um procedimento realizado sob analgesia para remover a placenta de dentro do útero.
Uma vez que a placenta é expulsa, a equipe realiza uma avaliação indispensável:
- Exame da Placenta: O profissional a examina cuidadosamente para certificar-se de que está íntegra. A retenção de fragmentos placentários no útero pode causar sangramento tardio e infecção, exigindo uma revisão da cavidade uterina.
- Avaliação do Canal de Parto: O colo do útero, a vagina e o períneo são inspecionados em busca de lacerações, que são prontamente suturadas para controlar o sangramento e garantir a cicatrização adequada.
Parto Taquitócico (ou Precipitado): Quando o Nascimento é Rápido Demais
Enquanto muitas complicações se concentram em processos lentos, existe um cenário oposto que também exige cuidado: o parto taquitócico. Este termo descreve um trabalho de parto que progride de forma extremamente rápida, com todo o processo ocorrendo em um período inferior a quatro horas.
A causa é uma hiperatividade uterina, na qual as contrações são excessivamente fortes ou frequentes (taquissistolia), impulsionando o bebê pelo canal de parto de maneira avassaladora. Embora a ideia de um parto rápido pareça atraente, a velocidade excessiva traz riscos, pois não há tempo para a acomodação adequada das estruturas.
Riscos e Conduta Clínica
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Riscos para a Mãe:
- Lacerações do canal de parto: A passagem abrupta do bebê pode causar lesões extensas no colo do útero, vagina e períneo.
- Hipotonia ou Atonia Uterina: Após um esforço tão intenso, o músculo uterino pode ficar "exaurido" e não contrair eficientemente após a dequitação, elevando drasticamente o risco de hemorragia pós-parto.
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Riscos para o Bebê:
- Sofrimento Fetal: As contrações muito frequentes podem comprometer o fluxo de oxigênio para o bebê.
- Hemorragia Ventricular: A compressão e descompressão súbita da cabeça do bebê pode causar hemorragia dentro dos ventrículos cerebrais, uma complicação neonatal grave.
Diante de um parto que se desenrola rapidamente, a equipe médica foca em mitigar os riscos com monitoramento contínuo, evitando procedimentos que acelerem ainda mais o processo (como a ruptura artificial da bolsa) e preparando-se para manejar suas possíveis consequências, como a hemorragia e a necessidade de assistência neonatal especializada.
A Primeira Hora Dourada: O Crucial Quarto Período do Parto
Após a expulsão da placenta, inicia-se o quarto período do parto, também conhecido como Período de Greenberg. Este intervalo, que compreende a primeira hora após a dequitação, é um momento de transição intensa e vigilância máxima, sendo fundamental para a segurança materna.
Este período é considerado o de maior risco para a hemorragia pós-parto (HPP). A atenção da equipe se volta para garantir que o útero cumpra sua função hemostática através de dois mecanismos vitais:
- Miotamponamento: As fibras musculares do útero se contraem vigorosamente, comprimindo os vasos sanguíneos que antes nutriam a placenta. Essa engenhosa arquitetura é chamada de "ligaduras vivas de Pinard".
- Trombotamponamento: Como mecanismo secundário, ocorre a formação de coágulos (trombos) no local, ajudando a selar os vasos.
Apesar de sua criticidade clínica, esta primeira hora também é um momento mágico para o vínculo, sendo chamada de "Golden Hour". Quando as condições permitem, o contato pele a pele imediato é incentivado, pois ajuda a regular os sinais vitais do bebê, estimula a liberação de ocitocina na mãe (o que ajuda a contrair o útero) e fortalece o laço afetivo. O Período de Greenberg marca, assim, o fim do parto e o início do puerpério, o período de recuperação do corpo que se estende pelas semanas seguintes.
Da expulsão da placenta ao primeiro contato pele a pele, as fases finais do nascimento são um balé complexo de fisiologia, vigilância médica e emoção. Compreender a importância da dequitação, os riscos de um parto rápido demais e a natureza dupla da "Hora Dourada" — um momento de alerta clínico máximo e de profundo vínculo afetivo — transforma a maneira como encaramos o final dessa jornada. A informação capacita você a ser uma participante ativa no seu cuidado.
A mensagem final é clara: a comunicação aberta e constante com sua equipe de saúde é a sua maior ferramenta de segurança. Agora que você explorou a fundo este tema essencial, que tal testar seus conhecimentos? Confira nossas Questões Desafio preparadas especialmente sobre este assunto