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Guia Completo

Derrame Pleural: Guia Completo de Diagnóstico, Toracocentese e Drenagem Torácica

Por ResumeAi Concursos
Corte torácico: derrame pleural comprimindo pulmão, com cateter para drenagem ou toracocentese.


O derrame pleural, condição caracterizada pelo acúmulo anormal de líquido entre as membranas que revestem os pulmões e a parede torácica, representa um desafio diagnóstico e terapêutico comum na prática médica. Compreender suas múltiplas causas, desde insuficiência cardíaca até infecções e neoplasias, e dominar as nuances do seu manejo – incluindo a indispensável toracocentese e a crucial drenagem torácica – é fundamental para qualquer profissional de saúde que busca oferecer o melhor cuidado. Este guia completo foi elaborado para capacitar você, leitor, a navegar com segurança por este tema complexo, oferecendo um roteiro claro desde a suspeita inicial até as intervenções mais especializadas, sempre com foco na qualidade da informação e na aplicabilidade clínica.

Entendendo o Derrame Pleural: Causas, Tipos e Sinais de Alerta

O que é Derrame Pleural?

O derrame pleural é definido como o acúmulo anormal de líquido no espaço pleural – a delgada cavidade virtual entre as duas membranas (pleuras) que revestem os pulmões e a parede torácica. Em condições normais, uma pequena quantidade de líquido pleural (cerca de 5-15 mL) existe nesse espaço, atuando como lubrificante. O desequilíbrio entre a produção e a absorção desse líquido leva ao seu acúmulo.

Principais Causas: Uma Diversidade de Cenários Clínicos

As causas do derrame pleural são variadas:

  • Causas Infecciosas:

    • Derrame Parapneumônico: Associado a infecção pulmonar bacteriana (pneumonia) ou abscesso pulmonar. É um exsudato e sua progressão para derrame pleural complicado (com loculações, pH baixo, glicose baixa) ou empiema (pus) é uma complicação grave.
    • Tuberculose Pleural: Causa significativa, especialmente em regiões endêmicas, produzindo um exsudato linfocítico.
  • Causas Não Infecciosas:

    • Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC): Causa mais comum mundialmente, resultando em transudato, frequentemente bilateral.
    • Cirrose Hepática (Hidrotórax Hepático): Migração de líquido ascítico, causando transudato, mais comum à direita.
    • Neoplasias: Cânceres de pulmão, mama, linfomas e metástases são causas importantes de derrame exsudativo.
    • Tromboembolismo Pulmonar (TEP): Mais frequentemente causa exsudato, geralmente pequeno e unilateral.
    • Doenças do Colágeno: Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) e Artrite Reumatoide (AR) podem causar derrame exsudativo.
    • Hipotireoidismo (Mixedema): Pode causar transudato.
    • Outras Causas: Síndrome nefrótica (transudato), pancreatite (exsudato), pós-operatório, trauma (hemotórax). Derrame pleural não é comum em DPOC não complicada.

Tipos de Derrame Pleural: Transudato vs. Exsudato

A diferenciação entre transudato e exsudato, realizada pela análise do líquido pleural (obtido por toracocentese) usando os critérios de Light, é crucial:

  • Transudato:

    • Mecanismo: Desequilíbrio nas pressões sistêmicas (aumento da hidrostática ou diminuição da oncótica) sem doença pleural primária.
    • Causas Comuns: ICC, cirrose, síndrome nefrótica, diálise peritoneal, hipotireoidismo.
    • Características do Líquido (Critérios de Light negativos):
      1. Relação proteína pleural/sérica < 0,5
      2. Relação DHL pleural/sérica < 0,6
      3. DHL pleural < 2/3 do limite superior da normalidade do DHL sérico.
  • Exsudato:

    • Mecanismo: Processos que afetam diretamente a pleura (inflamação, infecção, neoplasia), aumentando a permeabilidade capilar ou prejudicando a drenagem linfática.
    • Causas Comuns: Infecções (pneumonia, tuberculose), neoplasias, TEP, doenças autoimunes, pancreatite.
    • Características do Líquido: Pelo menos um dos critérios de Light é positivo.
    • Variações Especiais (geralmente exsudativos ou com características próprias):
      • Empiema: Pus franco ou evidência de infecção bacteriana no líquido.
      • Hemotórax: Hematócrito no líquido pleural > 50% do periférico.
      • Quilotórax: Linfa no espaço pleural (triglicerídeos > 110 mg/dL e/ou quilomícrons).

Sinais de Alerta: Quando Suspeitar de Derrame Pleural

A apresentação depende do volume, velocidade de formação e doença de base.

  • Sintomas Respiratórios Comuns:

    • Dispneia: Mais frequente.
    • Dor Torácica Pleurítica: Aguda, piora com inspiração profunda ou tosse.
    • Tosse: Geralmente seca.
  • Sintomas Sistêmicos e Associados:

    • Febre, calafrios: Sugerem infecção.
    • Perda de peso, astenia: Podem acompanhar tuberculose, neoplasias.
    • Ortopneia, edema de membros inferiores: Sugestivos de ICC.
  • Achados Propedêuticos (Exame Físico):

    • Inspeção: Diminuição da expansibilidade do hemitórax afetado.
    • Palpação: Frêmito tóraco-vocal diminuído ou abolido.
    • Percussão: Macicez ou submacicez (linha parabólica de Damoiseau-Ellis).
    • Ausculta Pulmonar: Murmúrio vesicular diminuído ou abolido; possível sopro pleurítico e egofonia na borda superior. Atrito pleural é menos comum com derrame significativo.
    • Trepopneia: Dispneia ao deitar sobre o lado contralateral ao derrame.

Apresentação Radiológica Inicial

A radiografia de tórax (PA e perfil) é frequentemente o primeiro exame:

  • Achados Típicos:
    • Obliteração do seio costofrênico posterior (perfil, >75 mL) e lateral (PA, >175-200 mL).
    • Opacidade homogênea com limite superior côncavo (curva de Damoiseau).
    • Derrames volumosos (>1L) podem causar desvio contralateral do mediastino.
    • Derrame loculado: Líquido aprisionado, não móvel, sugere processo inflamatório intenso (empiema, tuberculose, neoplasia).
    • Espessamento pleural crônico: Pode ser sequela ou condição primária.

A presença de derrame pleural, especialmente associado a infecções, pode indicar maior gravidade e justificar internação.

Diagnóstico Detalhado do Derrame Pleural: Da Suspeita à Confirmação

Da Suspeita Clínica à Imagem Inicial

A investigação parte de sintomas como dispneia, dor torácica pleurítica e tosse, e achados ao exame físico como macicez à percussão e abolição dos murmúrios vesiculares. A radiografia de tórax confirma a presença do derrame, mostrando obliteração do seio costofrênico ou o sinal da parábola de Damoiseau. A incidência em decúbito lateral com raios horizontais (Laurel) detecta volumes menores.

Aprofundando a Investigação por Imagem: Ultrassonografia e Tomografia

  • Ultrassonografia Torácica (USG): Indispensável. Superior à TC para avaliar extensão, estágio evolutivo (agudo, fibrinopurulento, organizado) e identificar loculações e fibrina. O líquido aparece anecogênico. Crucial para guiar a toracocentese, aumentando a segurança e precisão.

  • Tomografia Computadorizada (TC) de Tórax: Reservada para casos complexos, suspeita de doença pulmonar subjacente (massas, doença intersticial) ou avaliação detalhada da pleura. Para características do líquido, a USG costuma ser mais informativa.

Toracocentese: Procedimento e Análise do Líquido Pleural

Diante de um derrame de causa desconhecida (exceto ICC típica sem sinais atípicos), a toracocentese diagnóstica (punção pleural) é fundamental. Pode também ser terapêutica (de alívio) em derrames volumosos sintomáticos. O procedimento, idealmente guiado por USG, envolve assepsia, anestesia local e inserção de agulha ou cateter para aspirar o líquido.

A análise do líquido pleural é crucial:

  • Avaliação Macroscópica:

    • Sanguinolento: Neoplasia, tuberculose, trauma, TEP.
    • Leitoso/Esbranquiçado: Quilotórax ou pseudoquilotórax.
    • Turvo/Purulento: Infecção (empiema).
    • Odor fétido: Infecção por anaeróbios.
  • Análise Bioquímica:

    • Critérios de Light: Já detalhados, diferenciam transudatos de exsudatos.
    • Glicose: Níveis baixos (< 60 mg/dL, especialmente < 40 mg/dL) em DPP complicado, empiema, tuberculose, neoplasias, artrite reumatoide.
    • pH: Um pH < 7,20 é marcador de DPP complicado ou empiema, indicando necessidade de drenagem.
    • DHL: Níveis > 1000 UI/L sugerem DPP complicado, empiema ou neoplasia.
    • Adenosina Deaminase (ADA): Níveis elevados sugerem tuberculose pleural, mas também podem aumentar em linfomas e empiemas.
  • Citologia: Contagem total e diferencial (neutrófilos: agudo/infeccioso; linfócitos: crônico como tuberculose/neoplasia) e citologia oncótica (células malignas).

  • Microbiologia: Gram, culturas (aeróbias, anaeróbias, fungos), pesquisa de BAAR conforme suspeita.

Classificação do Derrame Pleural, com Foco no Parapneumônico

O derrame pleural parapneumônico (DPP), associado à pneumonia, abscesso pulmonar ou bronquiectasia infectada, é classificado com base na análise do líquido:

  • DPP Não Complicado: Exsudato estéril, pH > 7,20, glicose > 60 mg/dL (ou >40 mg/dL), DHL < 1000 UI/L. Resolve com antibioticoterapia para a pneumonia.
  • DPP Complicado: Invasão bacteriana ou inflamação pleural intensa. pH < 7,20, e/ou glicose < 60 mg/dL (ou < 40 mg/dL), e/ou DHL > 1000 UI/L, e/ou loculações/líquido espesso na USG. Gram/cultura podem ser negativos. Necessita de drenagem torácica além de antibióticos.
  • Empiema Pleural: Pus franco ou identificação de bactérias no Gram/cultura. Sempre requer drenagem torácica e antibióticos.

Investigação Adicional e Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico diferencial é amplo, incluindo atelectasia (que traciona o mediastino), consolidação pulmonar, TEP, doenças do tecido conjuntivo e pancreáticas. Em exsudatos de etiologia indeterminada, a biópsia pleural (por agulha ou toracoscopia) pode ser necessária, especialmente na suspeita de tuberculose ou malignidade. A presença de DPP frequentemente indica pneumonia mais grave, justificando internação.

Drenagem Torácica: Indicações, Procedimento e Manejo

Indicações Cruciais para Drenagem Torácica

A drenagem torácica (toracostomia com dreno) visa evacuar coleções líquidas ou gasosas do espaço pleural. É indicada em:

  1. Derrame Pleural Complicado e Empiema:

    • Empiema Pleural: Presença de pus é indicação mandatória.
    • Derrame Parapneumônico Complicado: Indicada se bacteriologia positiva (Gram/cultura), e/ou pH < 7,2, e/ou glicose < 40 mg/dL, e/ou DHL > 1000 UI/L no líquido pleural. Derrames muito volumosos também podem necessitar. A drenagem precoce é crucial.
    • O tratamento inclui antibioticoterapia sistêmica vigorosa em conjunto com a drenagem.
  2. Trauma Torácico:

    • Hemotórax: Acúmulo de sangue. Drenagem para evacuar, monitorar débito (inicial >1500ml ou contínuo >200ml/h por 2-4h pode indicar toracotomia) e facilitar reexpansão.
    • Pneumotórax: Ar no espaço pleural. Indicada se sintomático, volumoso, em ventilação com pressão positiva, pneumotórax aberto (após curativo de três pontas) ou hipertensivo (após descompressão com agulha).
  3. Outras Condições:

    • Quilotórax: Acúmulo de linfa. Drenagem para alívio e monitoramento.
    • Derrame Pleural Neoplásico Recidivante: Para alívio ou como parte da pleurodese.
    • Pós-operatório de Cirurgias Torácicas/Cardíacas: Rotineiramente.

Técnica de Inserção do Dreno Torácico

  1. Localização: Comumente no 5º EIC, linha axilar anterior/média (ATLS). Para pneumotórax espontâneo, 2º EIC linha hemiclavicular. Coleções loculadas podem necessitar guia por imagem. Incisão sobre a borda superior da costela inferior.
  2. Anestesia: Local infiltrativa.
  3. Inserção: Após incisão e divulsão, exploração digital da cavidade pleural é fundamental para confirmar entrada, desfazer aderências frouxas e checar lesões diafragmáticas. Todos os orifícios do dreno devem ficar dentro da cavidade pleural.

Tipos de Drenos e Sistemas de Drenagem

  • Drenos: Tubulares (vários calibres) ou pigtail. Dreno de Penrose é inadequado.
  • Sistemas:
    • Selo d'água: Mais comum, válvula unidirecional. Frasco coletor sempre abaixo do nível do tórax.
    • Aspiração Contínua: Conectada ao selo d'água em fístula aérea persistente ou falha de reexpansão. Não rotineira inicialmente.

Manejo do Dreno Torácico: Cuidados Essenciais

  • Sítio de Inserção: Curativo limpo e seco. Avaliar sinais de infecção.
  • Funcionalidade: Dreno aberto e funcional durante mobilização. Oscilação do líquido no tubo indica perviedade.
  • Monitoramento do Débito: Registrar volume, cor, aspecto. Débito sanguíneo inicial >1500 mL ou contínuo >200-300 mL/h por 2-4h sugere hemotórax maciço.
  • Controle Radiográfico: Mandatório após inserção e antes da remoção.
  • Clampeamento: Não clampear rotineiramente. Permitido brevemente apenas na troca do frasco ou avaliação específica.

Critérios para Remoção do Dreno e Complicações

  • Critérios para Remoção: Reexpansão pulmonar adequada (RX), ausência de fuga aérea (24-48h), débito seroso <100-200 mL/24h, estabilidade clínica. Removido durante manobra de Valsalva.
  • Complicações do Dreno: Dor, malposicionamento, obstrução, infecção, lesão de estruturas adjacentes.
  • Contraindicações e Limitações da Drenagem Torácica: Distúrbios de coagulação graves, infecção no local, derrame mínimo (<10mm na USG ou RX em decúbito lateral), ausência de indicação clara (TEP agudo sem derrame/pneumotórax significativo, tamponamento cardíaco primário, abscesso pulmonar intraparenquimatoso pequeno, transudato não complicado, tuberculose pleural rotineiramente). Drenagem prolongada aumenta riscos. Hemotórax retido/coagulado pode necessitar VATS.

Manejo de Situações Específicas: Derrames Loculados e Fístulas Pleurais

  • Derrames Loculados: Dificultam a drenagem. Drenagem guiada por imagem ou videotoracoscopia (VATS) para lise de aderências e posicionamento do dreno podem ser necessários. Em fases tardias (empiema organizado), decorticação pleural pode ser indicada.
  • Fístulas Pleurais (Broncopleural ou Alveolopleural): Escape aéreo persistente. Manejo pode incluir aspiração contínua, observação ou intervenções (pleurodese, cirurgia). Um segundo dreno pode ser considerado em fístulas de alto débito.

Intervenções Mais Invasivas: Toracotomia no Trauma e Casos Complexos

Quando toracocentese e drenagem não são suficientes, ou em emergências, a toracotomia (abertura cirúrgica do tórax) é necessária.

Toracotomia no Trauma Torácico: Quando a Cirurgia Aberta é Vital

No politraumatizado, a decisão é urgente. Indicações para toracotomia de urgência:

  • Sangramento vultoso na drenagem inicial (≥1500ml).
  • Hemorragia contínua pós-drenagem (≥200ml/hora por 2-4 horas).
  • Tamponamento cardíaco.
  • Lesões específicas: árvore traqueobrônquica, rotura aórtica (sem opção endovascular), perfuração esofágica, fístula broncopleural extensa.
  • Feridas cardíacas penetrantes com instabilidade. A toracotomia é geralmente preferível à VATS para controle rápido de hemorragia em trauma.

Toracotomia de Reanimação: Uma Medida Heroica

Procedimento extremo em PCR traumática sem resposta às medidas convencionais. Objetivos: aliviar tamponamento, controlar hemorragias maciças, massagem cardíaca interna, clampeamento aórtico.

  • Indicações: Trauma penetrante com sinais de vida recentes evoluindo para PCR, ou PCR testemunhada na emergência. Em trauma contuso, indicações mais restritas (PCR muito curta).
  • Contraindicações: Ausência de pulso na cena (trauma penetrante), assistolia sem tamponamento, PCR >15 min (penetrante) ou >10-15 min (contuso), lesões incompatíveis com a vida.

Toracotomia em Casos Complexos de Derrame Pleural

  • Derrame Pleural Refratário: Empiemas loculados e crônicos não resolvidos por drenagem ou VATS podem necessitar toracotomia para decorticação.
  • Quilotórax Traumático: Acúmulo de linfa por lesão do ducto torácico. Causas: trauma (incluindo iatrogênico), neoplasias (linfoma). Cirurgia (ligadura do ducto ou pleurodese por toracotomia/VATS) indicada se falha do tratamento conservador (5-14 dias) ou quilotórax hipertensivo.

A toracotomia, apesar de invasiva, é insubstituível em lesões torácicas graves e derrames pleurais complicados quando outras opções falham.


Dominar o derrame pleural, desde sua fisiopatologia e diagnóstico até as nuances das intervenções torácicas, é uma jornada de aprendizado contínuo. Esperamos que este guia tenha solidificado seus conhecimentos e fornecido clareza sobre as melhores práticas no manejo desta condição. A capacidade de integrar os achados clínicos, radiológicos e a análise do líquido pleural é a chave para um tratamento eficaz e individualizado, impactando diretamente o prognóstico dos pacientes.

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