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Guia Completo

Diverticulite Aguda: Guia Completo de Classificação Hinchey, Complicações e Tratamento Moderno

Por ResumeAi Concursos
**** Segmento do cólon com diverticulite aguda: divertículos inflamados, perfuração e abscesso pericólico (Hinchey).

A diverticulite aguda, uma condição inflamatória que afeta o intestino grosso, pode variar de um desconforto leve a uma emergência médica com risco de vida. Compreender seus nuances – desde a classificação precisa de sua gravidade, como o sistema de Hinchey, até o espectro de complicações e as abordagens terapêuticas mais atuais – é fundamental não apenas para profissionais de saúde, mas também para pacientes que buscam informação confiável. Este guia completo foi elaborado para desmistificar a diverticulite aguda, oferecendo um panorama abrangente que capacita o leitor a entender melhor essa condição, suas implicações e os caminhos para um tratamento eficaz e uma recuperação bem-sucedida.

Entendendo a Doença Diverticular e a Crise de Diverticulite Aguda

A doença diverticular colônica é uma condição gastrointestinal comum, caracterizada pela formação de divertículos – pequenas bolsas ou saculações que se projetam para fora da parede do cólon. Esses divertículos são, na maioria das vezes, pseudodivertículos, pois consistem na herniação das camadas mais internas do intestino (mucosa e submucosa) através de pontos de fraqueza na camada muscular, sendo recobertos apenas pela serosa. Esse processo ocorre tipicamente por um mecanismo de pulsão, devido ao aumento da pressão dentro do lúmen colônico.

É fundamental distinguir dois termos chave:

  • Diverticulose: Refere-se simplesmente à presença de múltiplos divertículos no intestino, mais comumente no cólon sigmoide. Em países ocidentais, cerca de 95% dos pacientes com diverticulose apresentam acometimento do sigmoide. A diverticulose, por si só, é frequentemente assintomática.
  • Diverticulite: Ocorre quando um ou mais desses divertículos se tornam inflamados e/ou infectados. A diverticulite aguda é uma complicação da diverticulose, representando um processo inflamatório que pode variar de leve a grave.

A prevalência da diverticulose aumenta significativamente com a idade, afetando menos de 20% das pessoas aos 40 anos, mas podendo chegar a 60-80% em indivíduos com mais de 80 anos. Um dos principais fatores de risco é uma dieta pobre em fibras, que leva a fezes endurecidas e menor volume fecal, exigindo maior esforço do cólon e aumentando a pressão intraluminal. Isso favorece a herniação da mucosa e submucosa nos pontos de menor resistência da parede colônica, geralmente onde os vasos sanguíneos penetram a camada muscular.

A diverticulite aguda surge quando a obstrução do colo de um divertículo por material fecal endurecido (fecalito) leva à abrasão da mucosa, inflamação, proliferação bacteriana e, subsequentemente, à micro ou macroperfuração do divertículo. Essa perfuração desencadeia uma resposta inflamatória localizada (peridiverticulite) ou, em casos mais graves, infecções extensas como abscessos ou peritonite. Cerca de 4% a 15% dos indivíduos com diverticulose podem desenvolver um episódio de diverticulite aguda. Embora a diverticulose possa ser silenciosa, a diverticulite causa sintomas significativos como dor abdominal (tipicamente na fossa ilíaca esquerda), febre e alterações do hábito intestinal. A doença diverticular também pode levar a sangramento diverticular (geralmente na ausência de inflamação aguda) e, mais raramente, fístulas ou obstrução intestinal.

Sinais, Sintomas e Diagnóstico Preciso da Diverticulite Aguda

Reconhecer a diverticulite aguda precocemente é crucial. O quadro clínico frequentemente se inicia com dor abdominal, sendo a localização mais comum a fossa ilíaca esquerda (FIE). Outros sinais e sintomas incluem febre, constipação (embora diarreia possa ocorrer), náuseas, vômitos, e, em alguns casos, massa abdominal palpável ou sintomas urinários devido à proximidade do sigmoide inflamado com a bexiga. Sinais de irritação peritoneal podem indicar peritonite localizada. Exames laboratoriais podem mostrar leucocitose com desvio à esquerda e aumento da Proteína C Reativa (PCR).

Embora a clínica seja sugestiva, a confirmação diagnóstica e a avaliação da gravidade dependem de exames de imagem:

  • Tomografia Computadorizada (TC) de Abdome e Pelve com Contraste: É o exame padrão-ouro, com alta sensibilidade e especificidade. A TC confirma a inflamação (espessamento da parede colônica, aumento da densidade da gordura pericólica), detecta complicações (abscessos, pneumoperitônio, fístulas, obstrução) e auxilia no estadiamento pela Classificação de Hinchey, além de excluir outras patologias.
  • Ultrassonografia (USG) Abdominal: Alternativa em pacientes jovens, gestantes ou quando a TC não está disponível, mas é examinador-dependente e menos acurada em obesos ou com muito gás intestinal.
  • Radiografia Simples de Abdome: Baixa especificidade para diverticulite, útil para detectar pneumoperitônio ou sinais de obstrução intestinal.
  • Ressonância Magnética (RM): Não é a primeira escolha devido ao custo, disponibilidade e tempo de aquisição.

A colonoscopia é contraindicada na fase aguda da diverticulite devido ao risco de perfuração. Sua realização é indicada após a resolução do quadro agudo (6-8 semanas) para excluir neoplasia colorretal e avaliar a extensão da doença diverticular. O toque retal tem valor limitado para o diagnóstico específico.

Classificação de Hinchey e Outros Estadiamentos: Decifrando a Gravidade

Compreender a gravidade da diverticulite aguda é fundamental, e a Classificação de Hinchey, descrita em 1978, é a pedra angular para estadiar a diverticulite aguda complicada por perfuração, orientando a terapia. Originalmente baseada em achados intraoperatórios, hoje é frequentemente guiada por TC.

  • Hinchey Estágio 0 (ou Diverticulite Não Complicada): Diverticulite leve, com espessamento da parede colônica e alterações inflamatórias na gordura adjacente (fleimão), sem abscesso ou perfuração livre.
  • Hinchey Estágio I: Abscesso pericólico ou mesentérico confinado.
    • Hinchey Ia (Modificado): Fleimão ou inflamação pericólica confinada, ou apenas gás livre pericólico.
    • Hinchey Ib (Modificado): Abscesso pericólico ou mesentérico propriamente dito.
  • Hinchey Estágio II: Abscesso bloqueado, porém localizado à distância (pélvico, retroperitoneal ou intra-abdominal distante), mas contido.
  • Hinchey Estágio III: Peritonite purulenta generalizada (difusa), devido à ruptura de um abscesso.
  • Hinchey Estágio IV: Peritonite fecal generalizada (difusa), com comunicação livre entre o lúmen intestinal e a cavidade peritoneal.

A Classificação de Hinchey Modificada por Kaiser (ou outras baseadas em TC) alinha-se melhor aos achados de imagem:

  • Estágio 0: Diverticulite leve/não complicada.
  • Estágio Ia: Fleimão pericólico ou pequenas bolhas de ar pericólicas confinadas.
  • Estágio Ib: Abscesso pericólico ou mesocólico confinado (geralmente ≤ 5 cm).
  • Estágio II: Abscesso pélvico, intra-abdominal à distância, retroperitoneal; ou abscesso pericólico > 5 cm.
  • Estágio III: Peritonite purulenta generalizada.
  • Estágio IV: Peritonite fecal.

Qualquer diverticulite com abscesso (Hinchey Ib ou II) é considerada complicada. A diverticulite não complicada refere-se aos estágios 0 ou Ia. Outros sistemas, como o da WSES e a classificação de Ambrosetti, também contribuem para a estratificação. Um estadiamento preciso é o primeiro passo para um manejo eficaz.

Complicações da Diverticulite Aguda: Abscessos, Perfuração, Fístulas e Peritonite

A diverticulite aguda pode evoluir para complicações sérias em cerca de 25% dos casos.

1. Abscessos Diverticulares: É a complicação infecciosa mais frequente (16-56% dos hospitalizados). São coleções de pus resultantes da contenção de uma perfuração. Podem ser pericólicos (Hinchey I) ou pélvicos/intra-abdominais à distância (Hinchey II). A TC é crucial para diagnóstico e planejamento.

2. Perfuração Intestinal e Pneumoperitônio: Uma perfuração maior pode levar ao extravasamento de conteúdo intestinal. O pneumoperitônio (ar livre na cavidade abdominal) é um sinal de perfuração. Perfuração livre com contaminação fecal extensa configura Hinchey IV.

3. Peritonite: Inflamação do peritônio.

  • Peritonite Purulenta Difusa (Hinchey III): Ruptura de abscesso com pus espalhado pela cavidade. Mortalidade pode atingir 20%.
  • Peritonite Fecal Difusa (Hinchey IV): Extravasamento franco de fezes. Emergência cirúrgica com alta mortalidade. Ambas representam risco de sepse abdominal.

4. Fístulas: Comunicações anormais entre o cólon e órgãos adjacentes ou a pele (cerca de 2% das complicações agudas). A fístula colovesical (com a bexiga) é a mais comum, causando pneumatúria, fecalúria e infecções urinárias de repetição. Outras incluem fístulas colovaginal, coloentérica, colouterina e colocutânea.

5. Obstrução Intestinal: O processo inflamatório pode causar estreitamento do lúmen, levando à obstrução parcial ou, raramente, total. Episódios repetidos podem levar à fibrose e estenose crônica.

Qualquer complicação infecciosa, especialmente abscessos não tratados e peritonites, carrega risco de sepse abdominal, uma condição com alta mortalidade.

Tratamento da Diverticulite Aguda: Da Abordagem Conservadora à Antibioticoterapia

O manejo da diverticulite aguda adapta-se à gravidade (guiado pela Classificação de Hinchey).

Abordagem Conservadora:

Para diverticulite não complicada (Hinchey 0) ou com inflamação localizada (Hinchey I), o tratamento conservador visa controlar a inflamação e aliviar sintomas.

  1. Repouso Intestinal e Dieta: Dieta líquida clara ou pobre em resíduos na fase aguda, progredindo conforme tolerância. Hidratação é fundamental.
  2. Analgesia: Paracetamol ou dipirona. AINEs com cautela. Evitar morfina.

Manejo Ambulatorial (Hinchey 0):

Pacientes estáveis, sem sinais de sepse, com boa tolerância oral e capazes de seguir orientações, podem ser tratados ambulatorialmente.

  • Critérios: Ausência de comorbidades significativas, imunossupressão, sinais de peritonite, febre alta, leucocitose importante.
  • Antibioticoterapia Oral: Embora debatida em casos leves, ainda é prática comum. Esquemas cobrem Gram-negativos e anaeróbios (ex: Ciprofloxacino + Metronidazol, Amoxicilina-clavulanato).
  • Orientações: Dieta líquida/branda, analgesia, reavaliação médica em 2-3 dias.

Tratamento Hospitalar (Hinchey I e II):

Indicado para pacientes com diverticulite não complicada que não preenchem critérios para manejo ambulatorial, ou para Hinchey I e II.

  • Diverticulite Hinchey I (Fleimão ou Abscesso Pericólico Pequeno < 4 cm): Internação, repouso intestinal, hidratação endovenosa (IV) e antibioticoterapia IV (ex: Ceftriaxona + Metronidazol, Piperacilina-tazobactam). Após melhora (48-72h), transição para antibióticos orais. Duração total: 7-14 dias.
  • Diverticulite Hinchey II (Abscesso Pélvico, Intra-abdominal Distante ou Retroperitoneal): Internação, repouso intestinal, hidratação e antibioticoterapia IV.
    • Abscessos ≥ 4 cm: Drenagem percutânea guiada por imagem é o tratamento de escolha, associada à antibioticoterapia IV.
    • Abscessos < 4 cm: Podem ser tratados apenas com antibioticoterapia IV, com monitoramento rigoroso.

Antibioticoterapia:

Cobre Gram-negativos e anaeróbios. Duração de 7-14 dias. A decisão de não usar antibióticos em diverticulite não complicada muito leve é controversa e deve ser individualizada.

Sinais de Alerta e Falha no Tratamento Conservador:

Piora da dor, febre persistente, aumento da leucocitose, sinais de peritonite, vômitos persistentes, ausência de melhora em 48-72h podem indicar necessidade de intensificar o tratamento ou cirurgia.

Quando a Cirurgia é Necessária? Intervenções na Diverticulite Aguda Complicada

A cirurgia é crucial quando surgem complicações graves. Indicações incluem:

  • Peritonite difusa (Hinchey III e IV).
  • Abscessos grandes (> 4-5 cm) ou não drenáveis percutaneamente (Hinchey I e II).
  • Falha do tratamento conservador.
  • Obstrução intestinal.
  • Fístulas.
  • Perfuração livre com pneumoperitônio.
  • Imunossupressão (pode indicar cirurgia mais precoce).

Intervenções cirúrgicas:

  1. Drenagem Percutânea Guiada por Imagem: Primeira linha para abscessos Hinchey I e II (> 4-5 cm), associada a antibióticos. Controla a infecção, podendo evitar cirurgia de urgência.
  2. Manejo Cirúrgico da Peritonite (Hinchey III e IV) e Outras Complicações Graves:
    • Cirurgia de Hartmann (Ressecção com Colostomia Terminal e Fechamento do Coto Retal): Padrão-ouro para Hinchey III e IV, especialmente em pacientes instáveis. Ressecção do segmento doente, colostomia e fechamento do coto retal. Evita anastomose em ambiente contaminado. Requer segunda cirurgia para reconstrução.
    • Ressecção com Anastomose Primária (com ou sem Estomia de Proteção): Considerada em pacientes selecionados, estáveis, com Hinchey III e mínima contaminação, ou falha do tratamento conservador sem peritonite difusa. Risco de deiscência da anastomose. Contraindicada em Hinchey IV ou pacientes instáveis.
    • Lavagem Laparoscópica e Drenagem Peritoneal: Alternativa minimamente invasiva para casos selecionados de Hinchey III estáveis. Controvérsia sobre eficácia e taxa de reintervenções. Não recomendada para Hinchey IV.
    • Manejo Cirúrgico da Obstrução e Fístulas: Geralmente requer ressecção do segmento afetado e reparo do órgão adjacente (fístulas).

Abordagens inadequadas incluem sutura simples da perfuração, exteriorização sem ressecção, ou drenagem cirúrgica isolada em peritonite fecal. A escolha da cirurgia é individualizada.

Vida Após a Crise: Acompanhamento, Prevenção de Recorrências e Casos Especiais

Superada a fase aguda, o foco é na recuperação e prevenção.

A Importância da Colonoscopia de Seguimento

Realizada 6 a 8 semanas após a melhora completa, para confirmar a doença diverticular, avaliar sua extensão e, crucialmente, excluir malignidade (câncer colorretal), que pode mimetizar ou coexistir com a diverticulite. A colonoscopia é contraindicada na fase aguda.

Prevenção de Novas Crises: Dieta e Estilo de Vida

  • Dieta Rica em Fibras: Frutas, vegetais, legumes, grãos integrais.
  • Hidratação Adequada.
  • Atividade Física Regular.
  • Evitar o Tabagismo. A restrição de nozes, sementes e pipoca não é mais universalmente recomendada.

Manejo da Diverticulite Crônica/Recorrente e Indicações Cirúrgicas Eletivas

  • Diverticulite Crônica Latente: Sintomas persistentes (dor, sensibilidade) podem indicar cirurgia eletiva (sigmoidectomia).
  • Episódios Recorrentes de Diverticulite Não Complicada: A decisão cirúrgica é individualizada, considerando frequência/gravidade das crises, impacto na qualidade de vida, sintomas persistentes, idade, comorbidades e risco de complicações futuras (ex: em imunossuprimidos). Um episódio prévio de diverticulite complicada (Hinchey III ou IV) frequentemente indica cirurgia eletiva.

Pacientes com diverticulose sintomática ou histórico de diverticulite necessitam de acompanhamento especializado.

Particularidades em Pacientes Idosos

  • Elevada Incidência: Causa comum de abdome agudo inflamatório em >60 anos.
  • Apresentação Clínica Típica: Dor na FIE e febre são altamente sugestivos.
  • Desafios Diagnósticos: Sintomas podem ser atípicos ou sutis, exigindo alto índice de suspeição.

Atualizações e Orientações Gerais

  • Acompanhamento da Diverticulose Assintomática: Geralmente, apenas orientações dietéticas e de estilo de vida.
  • Relação com Câncer Colorretal: Doença diverticular não é precursora de câncer, mas a colonoscopia pós-crise é vital para exclusão.
  • Busca por Orientação Médica: Essencial antes de automedicação, especialmente analgésicos ou anti-inflamatórios.

A vida após a diverticulite aguda envolve uma parceria entre paciente e equipe médica, com foco em seguimento, prevenção e manejo personalizado para garantir qualidade de vida.

Navegar pelo universo da diverticulite aguda, desde a sua formação e classificação até as complexidades do tratamento e da vida após uma crise, é uma jornada de conhecimento essencial. Esperamos que este guia tenha fornecido clareza e informações valiosas, capacitando você a compreender melhor esta condição e a dialogar de forma mais informada com os profissionais de saúde. O manejo eficaz da diverticulite aguda depende de um diagnóstico preciso, de uma estratégia terapêutica bem definida e de um acompanhamento cuidadoso, visando sempre o bem-estar e a qualidade de vida do paciente.

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