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Guia Completo

Dominando Procedimentos Torácicos: Guia ATLS para Descompressão, Compressão e Toracotomia

Por ResumeAi Concursos
Secção anatômica do tórax com bisturi e dreno para procedimentos de toracotomia e descompressão torácica.

No cenário de uma emergência, o domínio de procedimentos torácicos críticos é a linha tênue que separa o caos da conduta assertiva. Este guia foi elaborado para ir além do protocolo, oferecendo um olhar aprofundado sobre as técnicas que definem desfechos, desde a descompressão torácica baseada nas mais recentes diretrizes do ATLS até as indicações precisas para uma toracotomia de reanimação. Nosso objetivo é transformar conhecimento teórico em confiança prática, equipando você, profissional de saúde, para agir com precisão quando cada segundo conta.

O Ponto de Partida: Avaliação Rápida da Dor e Expansibilidade Torácica

No cenário de uma emergência torácica, cada segundo é crucial. Uma avaliação rápida, precisa e sistemática define o prognóstico do paciente. Antes de qualquer procedimento invasivo, o ponto de partida é sempre um exame clínico focado, que nos permite identificar sinais de gravidade e direcionar a intervenção imediata. Esta avaliação inicial se apoia em dois pilares fundamentais: a caracterização da dor torácica e a análise da expansibilidade da caixa torácica.

Avaliação da Dor Torácica no Pronto-Socorro

A dor torácica é uma das queixas mais desafiadoras no pronto-socorro. A abordagem inicial deve ser metódica e focada em três parâmetros essenciais:

  1. Caracterização da Dor: Qual é o tipo de dor? É em aperto, pontada, queimação? Irradia? É ventilatório-dependente? Uma dor pleurítica (aguda e que piora com a inspiração) pode sugerir um tromboembolismo pulmonar (TEP), enquanto uma dor opressiva pode indicar uma síndrome coronariana aguda.
  2. Estratificação do Risco Cardiovascular: Avaliar os fatores de risco do paciente (hipertensão, diabetes, tabagismo) ajuda a determinar a probabilidade de a dor ser de origem coronariana. Ferramentas como o HEART Score são extremamente úteis para guiar a conduta.
  3. Eletrocardiograma (ECG): Deve ser realizado e interpretado nos primeiros 10 minutos da chegada do paciente para identificar sinais de isquemia ou lesão miocárdica.

O exame físico complementa essa tríade, buscando ativamente por "bandeiras vermelhas". A verificação de diferença de pressão arterial e pulsos entre os membros é um sinal clássico de dissecção de aorta. A presença de turgência jugular ou edema de membros inferiores pode indicar disfunção do ventrículo direito, comum no TEP.

Avaliação da Expansibilidade Torácica

Enquanto a dor nos dá pistas sobre a etiologia, a mecânica respiratória nos informa sobre a urgência. A avaliação da expansibilidade torácica é um passo crítico da palpação, sendo mais sensível que a inspeção ou a ausculta isoladas para detectar assimetrias.

A técnica de palpação da expansibilidade é simples e eficaz:

  • Para os Ápices Pulmonares: Posicione as mãos nos ombros do paciente (vista posterior), com os polegares próximos à linha média (C7). Peça para inspirar profundamente e observe o afastamento simétrico dos seus polegares.
  • Para as Bases Pulmonares: Abrace a porção inferior do tórax do paciente, unindo os polegares na linha média (T10). Durante a inspiração, os polegares devem se afastar de forma igual.

Achados anormais nesta avaliação são sinais de alerta imediatos:

  • Expansibilidade Diminuída ou Ausente Unilateralmente: Achado clássico em condições como derrame pleural, hemotórax maciço e pneumotórax.
  • Expansibilidade Diminuída Bilateralmente: Pode ser observada em pacientes com DPOC avançada ou doenças intersticiais difusas.

A combinação de dor súbita com expansibilidade diminuída unilateralmente, murmúrio vesicular abolido e percussão timpânica eleva a suspeita de um pneumotórax hipertensivo, uma condição que exige intervenção imediata.

Descompressão Torácica: A Evolução Crucial das Diretrizes ATLS

Quando a avaliação aponta para um pneumotórax hipertensivo, a ação deve ser imediata. O acúmulo de ar sob pressão no espaço pleural não apenas colapsa o pulmão, mas também desvia o mediastino, podendo levar rapidamente à parada cardiorrespiratória. O objetivo primário da descompressão torácica é converter um pneumotórax hipertensivo em um pneumotórax simples, aliviando a pressão e restaurando a estabilidade hemodinâmica.

O protocolo ATLS (Advanced Trauma Life Support) descreve duas técnicas principais para esta emergência, realizadas na etapa B (Breathing) da avaliação primária:

  • Toracocentese por Agulha (Punção de Alívio): Inserção de um cateter sobre agulha de grosso calibre (ex: 14G) no espaço pleural.
  • Descompressão Digital (Toracostomia Simples): Incisão e dissecção romba até o espaço pleural, seguida pela inserção de um dedo para garantir a abertura.

A Mudança de Paradigma: Do 2º para o 5º Espaço Intercostal

Por muito tempo, a recomendação clássica era a punção no 2º espaço intercostal (EIC), na linha hemiclavicular. No entanto, estudos revelaram uma taxa de falha preocupantemente alta, principalmente devido à espessura da parede torácica em muitos pacientes, que excedia o comprimento do cateter.

Diante dessas evidências, a 10ª edição do ATLS consolidou uma mudança fundamental.

A Recomendação Atual: 5º Espaço Intercostal na Linha Axilar

A diretriz atual do ATLS preconiza que a descompressão torácica de emergência, seja por punção ou digital, seja realizada no:

5º espaço intercostal (EIC), entre a linha axilar anterior e a linha axilar média.

Este local, conhecido como "triângulo de segurança", foi escolhido por razões estratégicas:

  1. Maior Taxa de Sucesso: A parede torácica nesta região é consistentemente mais fina, aumentando a probabilidade de atingir o espaço pleural.
  2. Consistência com o Tratamento Definitivo: Este é o mesmo local para a inserção do dreno torácico, otimizando o fluxo de trabalho e evitando um segundo sítio de lesão.
  3. Segurança Aprimorada: Minimiza o risco de lesão ao parênquima pulmonar, coração e grandes vasos.

A abordagem no 2º EIC é, hoje, considerada obsoleta e não recomendada como primeira linha. A descompressão por agulha é uma medida temporária, que deve ser seguida imediatamente pela drenagem torácica com dreno.

A Qualidade que Salva Vidas: Parâmetros para Compressões Torácicas Eficazes

Enquanto a descompressão restaura a mecânica respiratória, muitas emergências torácicas culminam em parada cardiorrespiratória (PCR), exigindo outra habilidade fundamental: a reanimação cardiopulmonar (RCP) de alta qualidade. A eficácia dessa manobra não reside apenas em sua execução, mas na qualidade com que é realizada.

Os Pilares da Compressão Torácica de Alta Qualidade

Para garantir que cada compressão maximize a perfusão coronariana e cerebral, quatro parâmetros devem ser rigorosamente observados:

  1. Frequência Adequada: Comprima Rápido Mantenha uma frequência constante entre 100 e 120 compressões por minuto.

  2. Profundidade Correta: Comprima Forte Para adultos, a profundidade ideal é de no mínimo 5 cm e no máximo 6 cm (cerca de 1/3 do diâmetro anteroposterior do tórax).

  3. Retorno Completo do Tórax: Permita o Reenchimento Após cada impulso, é fundamental permitir o retorno total do tórax à sua posição de repouso, sem se apoiar sobre o paciente.

  4. Minimização das Interrupções: Mantenha o Fluxo Contínuo As pausas não devem ultrapassar 10 segundos. Para combater a fadiga, a troca do compressor deve ocorrer a cada 2 minutos.

Monitorando a Eficácia em Tempo Real: O Papel da Capnografia

A capnografia quantitativa de onda (EtCO₂) mede o dióxido de carbono ao final da expiração, refletindo o débito cardíaco gerado pelas compressões.

  • Meta de Qualidade: Durante a RCP, um valor de EtCO₂ persistentemente acima de 10 mmHg é um indicador de compressões de boa qualidade.
  • Sinal de Alerta: Se o EtCO₂ cair abaixo de 10 mmHg, a equipe deve otimizar a técnica imediatamente.

Associado à capnografia, a monitorização da pressão arterial diastólica (PAD), se disponível, também é útil. Uma PAD acima de 20 mmHg é outro indicador de RCP de alta qualidade.

Toracotomia de Reanimação: A Intervenção Definitiva na Emergência

No arsenal da medicina de emergência, poucas intervenções são tão dramáticas quanto a toracotomia de reanimação. Este é um último recurso realizado em pacientes à beira da morte, com o objetivo de reverter uma parada cardíaca decorrente de trauma.

Indicações Estritas: Quando o Invasivo se Torna Necessário

A decisão é baseada em critérios rigorosos, sendo o trauma torácico penetrante a indicação clássica e com maior taxa de sobrevida. Pacientes com ferimentos por arma branca ou de fogo no tórax que sofrem uma parada cardiorrespiratória testemunhada (ocorrida na sala de emergência ou durante o transporte, com sinais de vida prévios) são os candidatos ideais. Outras indicações incluem:

  • Tamponamento Cardíaco com deterioração rápida.
  • Hemorragia Exsanguinante de estruturas intratorácicas.
  • Embolia Aérea (rara).

É crucial notar que a toracotomia de reanimação tem um prognóstico muito reservado em casos de trauma contuso e raramente é indicada.

A Técnica e o Contexto

A via de acesso de eleição é a toracotomia anterolateral esquerda (4º ou 5º EIC), que oferece acesso rápido ao coração para:

  1. Abrir o pericárdio e aliviar o tamponamento.
  2. Controlar a hemorragia por sutura ou pinçamento.
  3. Realizar massagem cardíaca aberta, mais eficaz que a externa.
  4. Pinçar a aorta descendente para otimizar a perfusão cerebral e coronariana.

É fundamental distinguir:

  • Toracotomia de Reanimação: Realizada na sala de emergência em um paciente em PCR. É uma manobra de salvamento.
  • Toracotomia de Urgência: Realizada no centro cirúrgico em pacientes instáveis, mas com sinais vitais, para reparo definitivo.

Complicações e Abordagens Minimamente Invasivas (VATS)

Superada a fase crítica da reanimação, o manejo do paciente torácico continua, focando na resolução de complicações e no tratamento definitivo, onde técnicas modernas ganham destaque.

Potenciais Complicações de Procedimentos Torácicos

  • Pneumotórax Iatrogênico: Pode ocorrer durante acessos venosos centrais ou biópsias.
  • Hemotórax Retido: Acúmulo de coágulos na pleura que não são drenados, aumentando o risco de infecção (empiema) e fibrotórax.
  • Atelectasia: Colapso de alvéolos, comum no pós-operatório devido à dor que limita a respiração profunda.
  • Pneumomediastino: Ar no mediastino, um sinal de alerta para lesões graves como perfuração de traqueia ou esôfago.

A Revolução da Cirurgia Torácica Videoscópica (VATS)

A Cirurgia Torácica Videoscópica (VATS) é uma técnica minimamente invasiva que utiliza pequenas incisões para introduzir uma câmera e instrumentos, evitando uma grande abertura do tórax. As vantagens são significativas: menos dor, recuperação mais rápida e menor tempo de internação.

A VATS é o procedimento de escolha para diversas condições, incluindo:

  • Tratamento de Hemotórax Retido: É o padrão-ouro para a evacuação precoce de coágulos e lise de aderências (decorticação).
  • Pneumotórax Espontâneo Recidivante: Permite a ressecção de bolhas e a realização de pleurodese.
  • Diagnóstico e Estadiamento: Excelente para biópsias de pulmão, pleura e linfonodos.
  • Ressecções Oncológicas: Para tumores em estágios iniciais.

Embora a VATS seja a abordagem preferencial em muitos cenários, a toracotomia aberta ainda é insubstituível em casos de trauma grave com hemorragia incontrolável, reparos cardíacos complexos ou tumores grandes e invasivos.


Dominar os procedimentos torácicos de emergência é mais do que seguir um algoritmo; é sobre aplicar o conhecimento correto, no momento certo, com a técnica precisa. Desde a avaliação inicial que diferencia a urgência, passando pela descompressão no local anatômico mais eficaz e pela execução de compressões que realmente perfundem, até a decisão criteriosa por uma toracotomia, cada passo é decisivo. Este guia buscou consolidar esses pilares, transformando diretrizes em ações que salvam vidas.

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