Da bancada do laboratório para o armário de remédios, poucos fármacos são tão icônicos quanto o Ácido Acetilsalicílico (AAS). Mas a era do "AAS para todos" acabou. Hoje, prescrever aspirina é uma decisão complexa, uma balança delicada entre benefício e risco. Para você, futuro médico, dominar esse tema não é opcional, é essencial. Vamos desmistificar o AAS de uma vez por todas.
1. O Mecanismo: Mais do que um Analgésico, um Guarda-Costas Cardiovascular
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🎯 Otimize sua Preparação!Em doses baixas (75-100 mg), o AAS não está agindo como o analgésico que você toma para dor de cabeça. Sua mágica acontece nas plaquetas.
Ação-Chave: O AAS inibe permanentemente a enzima COX-1 nas plaquetas.
O Efeito: Ao bloquear a COX-1, ele impede a produção de tromboxano A2, o principal "sinalizador" que chama outras plaquetas para formar um coágulo.
Imagine as plaquetas como tijolos para construir um muro (o trombo). O AAS remove a "cola" (tromboxano A2) desses tijolos. Uma vez que uma plaqueta é exposta ao AAS, ela fica "desativada" por toda a sua vida (7-10 dias). É por isso que ele é um antiagregante, não um anticoagulante — ele impede a agregação, não interfere na cascata de coagulação como a varfarina.
2. Prevenção Secundária: O Território Inquestionável do AAS
Este é o cenário onde o AAS brilha e salva vidas. Prevenção secundária é evitar um novo evento em quem já tem doença cardiovascular estabelecida.
A indicação é clara e direta para pacientes com histórico de:
Infarto Agudo do Miocárdio (IAM)
AVC isquêmico
Angina (estável ou instável)
Doença arterial periférica
Pós-angioplastia com stent ou cirurgia de revascularização
Nesses casos, o benefício de usar AAS em baixas doses supera, e muito, o risco de sangramento. É terapia padrão ouro.
3. Prevenção Primária: O Fim da Era do "AAS para Todos"
É aqui que tudo mudou. Prevenção primária é tentar evitar o primeiro evento cardiovascular em pessoas sem doença conhecida. Por anos, o AAS foi usado liberalmente para isso. Não mais.
Estudos robustos (como o ARRIVE, ASCEND e ASPREE) mostraram que, para a maioria das pessoas, o pequeno benefício na prevenção não compensa o aumento significativo no risco de sangramentos graves (gastrointestinais e intracranianos).
A regra atual:
NÃO se recomenda AAS de rotina para prevenção primária.
A prescrição é uma exceção, reservada para pacientes de altíssimo risco cardiovascular e baixo risco de sangramento, após uma conversa franca e uma decisão compartilhada.
Para idosos (>70 anos) sem doença cardiovascular, o AAS é geralmente desaconselhado.
4. Na Emergência: Quando o AAS é uma Intervenção que Salva Vidas
No cenário agudo, o tempo é músculo (cardíaco ou cerebral), e o AAS é uma das primeiras armas.
#### Síndrome Coronariana Aguda (SCA)
Ação imediata: Em um IAM, uma dose de ataque de 160-325 mg de AAS mastigável é administrada na emergência. Por quê mastigável? Para uma absorção mais rápida. Essa simples medida pode reduzir a mortalidade em mais de 20%.
#### AVC Isquêmico
Cuidado crucial: Antes de administrar AAS, é obrigatório realizar uma Tomografia de Crânio para excluir um AVC hemorrágico. Dar AAS em um sangramento cerebral seria catastrófico.
Timing: Se o paciente não for candidato à trombólise, o AAS é iniciado em 24-48h. Se recebeu trombolítico, espera-se 24h para minimizar o risco hemorrágico.
5. Os Riscos e Contraindicações Absolutas
O poder do AAS é também sua fraqueza: o risco de sangramento. Mas existem outras armadilhas que você precisa conhecer.
Síndrome de Reye: NUNCA prescreva AAS para crianças ou adolescentes com infecções virais (gripe, catapora). O risco de desenvolver essa encefalopatia hepática aguda grave é uma contraindicação absoluta.
Dengue, Chikungunya e Zika: O AAS aumenta o risco de hemorragias graves nessas arboviroses. É contraindicado.
Alergia e DREA: Pacientes com hipersensibilidade ou com a Doença Respiratória Exacerbada pela Aspirina (asma, pólipos nasais e sensibilidade ao AAS) não podem usar o fármaco.
Dominar o uso do AAS é dominar uma parte fundamental da medicina interna e da cardiologia. Lembre-se sempre de pesar o benefício cardiovascular contra o risco hemorrágico para cada paciente à sua frente.